Rádio

O quarto de quatorze irmãos, Landell de Moura nasceu em 21 de janeiro de 1861, em Porto Alegre, filho de tradicionais famílias rio-grandenses, com ascendência inglesa. Aos 19 anos foi para o Rio de Janeiro cursar a Escola Politécnica. Formado em engenharia, seguiu junto com o irmão para Roma para ingressar na Universidade Gregoriana e no seminário, de onde voltou, já ordenado padre em 1886, com algumas de suas principais teorias já desenvolvidas. Teólogo, interessava-se também pelas ciências, especialmente por física e química, que estudou na Universidade Gregoriana. Em 1886, reza sua primeira missa na Igreja do Outeiro da Glória para Dom Pedro II e sua corte, incentivador das ciências no Brasil, que o ajudou a manter-se informado sobre os avanços da Física no mundo.


Na construção do seu transmissor de ondas, o pioneiro Landell de Moura se serviu de mecanismos como a pilha, o arco voltáico, a campainha, o eletro imã e o manipulador do telégrafo Morse, entre outros. Mas, acima de tudo, foram as descobertas do alemão Heinrinch Hertz, sobre ondas eletromagnéticas, que permitiram a Landell de Moura executar a invenção. “O trabalho de Landell de Moura foi muito importante, mas é fundamental lembrar que sem as teorias de Hertz nada disto teria sido possível”, lembra o vice-reitor da PUC, padre Pedro Guimarães, que também é engenheiro. Os inventos de Landell e Marconi tinham princípios diferentes. Enquanto Marconi trabalhou com a radiotelegrafia (transmissão de sinais de código Morse sem fio), Landell experimentou a radiofonia (transmissão de sinais de voz), unindo transmissores de ondas luminosas e eletromagnéticas.

Em 1888 em Berlim, Heinrich Hertz gerou ondas elétricas utilizando-se de uma haste com um pequeno espaçamento que a dividia em dois. Aplicando-se alta tensão entre as duas metades, centelhas atravessavam o pequeno espaçamento gerando violentas oscilações de alta frequência na região em torno do centelhamento. Hertz provou que estas ondas viajam no ar, ao captá-las com um circuito semelhante colocado a curta distância. Conseguiu também observar, tal qual previra Maxwell, que estas ondas viajavam a velocidade da luz e apresentavam características de reflexão e difração, podendo ser focalizadas por refletores côncavos. Em 1890 o francês Branly inventou o coesor: um tubo de vidro contendo fragmentos metálicos que apresenta alta resistência, mas que atua como curto-circuito na presença de um centelhamento produzido em suas proximidades.

O coesor tornava assim possível a recepção sem fio de sinais elétricos, a distâncias bem maiores, do que os experimentos de Hertz. Branly fez experiências de centelhas em circuito fechado em 1885, na Universidade Católica de Paris. O russo Alexander Popov foi o primeiro a utilizar-se de uma antena para recepção das ondas eletromagnéticas, além de desenvolver o coesor, com um pequeno motor capaz de remexer o dispositivo promovendo a descoesão das limalhas de ferro, fazendo-as retornar à situação original. Seus experimentos foram mostrados na Sociedade Física Russa em maio de 1895, onde Popov detectou a presença de ondas eletromagnéticas produzidas por descargas elétricas a milhas de distância, sem contudo fazer qualquer referência a utilização do sistema para transmissão de sinais por telegrafia. Somente em março de 1896, Popov demonstrou a transmissão de sinais Morse por 200 metros de um edifício a outro da universidade, surpreendendo-se que Marconi houvera feito experiência similar em 1895. O americano Mahlon Loomis utilizando de pipas que utilizavam fios condutores como linhas, construiu um sistema capaz de transmitir mensagens de uma pipa a outra pelo espaço utilizando como meio de transmissão, partículas elétricas presentes na atmosfera. Uma apresentação a congressistas americanos foi feita em 1868 e uma patente foi solicitada em julho de 1872, (primeira patente para telefonia sem fio, ainda que nada na patente indique que tenham sido utilizadas ondas de rádio, então desconhecidas). Três meses antes William Henry Ward em abril de 1872 também ganhou uma patente, ainda que não seja certo que tenha colocado o sistema para funcionar.

O padre Landell é conduzido a vigário em 1891, por um ano, na cidade de Uruguaiana/RS e em 1892 é transferido para São Paulo, onde foi vigário em Santos, Campinas e Santana. Apresentado publicamente em 6 de junho de 1900, do alto de Sant’Ana em São Paulo (atual Av. Paulista), o transmissor de ondas criado pelo padre, capaz de transmitir a voz humana, cobria a distância de oito quilômetros em linha reta (o aparelho exigia visada direta), mais do que o dobro da distância alcançada pelo invento de Marconi (em 1895, em Pontequio, próximo a Bologna, com a transmissão somente de telegrafia utilizando o Código Morse e não fonia), e trazia em seu sistema duas novidades: o microfone eletro mecânico e o auto-falante-telegráfico, que não constavam do sistema italiano. A exibição foi presenciada pelo Cônsul Britânico em São Paulo, Sr. C. P. Lupton,  autoridades brasileiras, povo e vários capitalistas paulistanos e noticiada no “Jornal do Comércio” de São Paulo, de 10 de junho de 1900. O jornalista contemporâneo do padre Landell, Ernani Fornari em seu livro “O incrível Padre Landell de Moura”, da Editora Globo, 1960, comenta que outras experiências públicas já haviam sido feitas em 1893. A primeira experiência pública, depois de Landell, para transmissão de voz humana, sem fio, foi realizada por Reginald Aubrey Fessenden, em 25 de dezembro de 1900, seis meses portanto, desta experiência de Landell.

Em 1984 a Fundação de Ciência e Tecnologia – CIENTEC, em Porto Alegre, construiu sob direção técnica do Eng. José Germany e o trabalho técnico da equipe do Eng. Antônio Carlos Solano, uma réplica daquele que pode ser considerado o primeiro aparelho de rádio do mundo: o transmissor de ondas (Wave Transmitter). Esta réplica encontra-se em exposição no saguão da Fundação Educacional e Cultural Padre Landell de Moura, na Av. Ipiranga, 3501, em Porto Alegre.

Em 2003, segundo informações de Ivan Dornelles ([email protected]) Marco Aurélio Cardoso Moura, de Porto Alegre, vem desenvolvendo uma nova réplica do Transmissor de Ondas. Na construção da réplica, Marco Aurélio contou com o apoio técnico dos senhores Rolf Stephan e Alexandre Stephan, diretores da Eletro-Mecânica Apex Ltda., de Porto Alegre. Observe na figura, a bobina de RuhmKorff com suas esferas metálicas. Na foto o microfone fonético não é mostrado. A construção demandou dois anos entre pesquisa, fabrico de peças e testes. Essas atividades foram sobremodo dificultadas pela inexistência de dados descritivos, tais como dimensões e tipos de materiais originalmente empregados. Marco Aurélio relata as dificuldades na construção: “O sistema realmente não funciona se os capacitores não forem construídos de forma adequada. Isso só foi possível com repetidas experimentações”. A parte mais crítica foi o interruptor fonético “o interruptor fonético (microfone) foi uma história a parte. Testei dez tipos de diafragmas e obtive resultados razoáveis com bronze fosforoso e com folha de flandres. Entretanto, o diafragma feito em madeira foi o que melhor respondeu às vibrações da voz. O diafragma de madeira foi feito com duas lâminas coladas (essas usadas para revestir móveis), com as fibras em ângulo de 90º. O material assim obtido ficou com a espessura de 1,30mm. Sem dúvida, o funcionamento do diafragma é um dos pontos mais críticos do aparelho. Inicialmente imaginava que o material devesse ser flexível e fino. Puro engano”. Se o diafragma não tiver a espessura adequada, o sistema não funciona. Nesse aspecto, é interessante verificar o que dizia o Padre Landell de Moura, em um dos trechos da descrição do projeto “… pode-se regular o ajustamento dos terminais fixos e do diafragma, até que a amplitude das vibrações seja suficiente para eliminar todos os tons, menos os fundamentais. De fato, pode ser dado mais peso ao diafragma, se assim for preciso, ou as suas pulsações podem ser, de outro modo, retardadas.”

Quando de retorno à sua precária oficina em Campinas, num cubículo da casa paroquial (onde tudo foi construído com suas míseras economias e onde ele não apenas idealizava seus aparelhos mas forjava peça por peça), encontrara tudo estraçalhado, revirado e incendiado pelos fiéis. À época de seus experimentos, a telegrafia e a telefonia com fio já estavam implantadas no Brasil. Em 1854 sob patrocínio de Pedro II, Guilherme Capanema implementou a primeira ligação telegráfica no Brasil entre São Cristóvão e o Ministério da Guerra. Ao final da monarquia já se haviam estendido quase 19 mil quilômetros de linhas telegráficas. Os primeiros registros da telegrafia, com fio, no Brasil, citados por Antônio Cabral e Hilário de Peixoto, em seu livro “Guia do viajante do Rio de Janeiro” de 1882, relata a presença de três fabricantes de telégrafos: a oficina da Western Brazilian Telepgraph Co. (do cabo submarino) e duas casas comerciais que lidavam com artigos para mágicos ! (“Ao grande Mágico” e “Ao rei dos mágicos”) de propriedade de Antônio Ribeiro Chaves que “fabricou telephonios segundo descrição da gazeta francesa Lumière Electrique”. O telefone exposto por Bell a Pedro II, durante a Exposição sobre o centenário em Filadéfia, 1876, foi instalado no ano seguinte na Quinta da Boa Vista. Em 1883 o Rio de Janeiro já contava com cerca de cem assinantes, enquanto no seguinte em 1884, seriam instalados os primeiros aparelhos em São Paulo. Em 1887, o número de assinantes no Brasil saltava para 5 mil.

O mágico Harry Houdini que investigou vários médiuns espíritas, publicou artigo na revista Popular Radio o artigo Ghosts that Talk–by Radio de outubro de 1922 um estudo que mostra a utilização de sistemas de rádio usados por médiuns, simulando supostas conversas com o além; “se existe algum médius que não seja fraudulento, eu o desconheço”. Amigo pessoal de Conan Doyle e Oliver Lodge, Houdini comentava: “Não há a menor sombra de dúvida em minha opinião de que eles (Doyle e Lodge) são sinceros em suas crenças. Embora os respeite por suas crenças no espiritualismo, não compartilho com eles tal crença”

À mesma época de Landell a Escola Politécnica realizava experimentos sobre telegrafia sem fio, sob coordenação do professor Henrique Morize. O Dr. Mario Ramos, em 1933 relata essa época: “Corria o final do ano de 1902 e eu modesto preparador do Gabinete de Física e Eletricidade da Escola Naval, ensaiava meus primeiros passos de professorado nas Ciências Físico-Químicas e na Eletrotécnica e acompanhava com um espírito atilado e uma curiosidade quase infantil as primeiras experiências que entre nós se faziam sobre a telegrafia sem fio. Os primeiros aqui eram justamente os Professores, Baptista da Escola Naval e Morize da Politécnica … O nosso gabinete tinha então recebido uma aparelhagem completa não só para as demonstrações práticas de transmissão e recepção como também os dispositivos para realização das célebres experiências de Hertz sobre oscilações elétricas ressonâncias, reflexão, polarização, etc. Eu dediquei-me então aos estudos, à montagem e à experimentação desses dispositivos, com um frenesi, uma assiduidade, um desejo de conhecimento e êxito … Os menores detalhes sobre o preparo da limalha e o funcionamento dos rádio condutores de Branly, as modificações das antenas e seus suplementos, a regularidade do funcionamento dos interruptores de mercúrio, a usura da bateria de acumuladores … Mais tarde em 1904 quando era então engenheiro da firma Guinle & Cia. obtive vir os aparelhos rádios De Forest para fazermos já experiências industriais, como fizemos de transmissões e recepções entre a Fortaleza de Santa Cruz e a Ponta de Castelhanos na Ilha Grande, esses dispositivos tinham para nós um especial interesse, o novo receptor eletrolítico muito sensível; Morize veio também acompanhar-me e assistir nesses trabalhos”. Quando Padre Landell tentou interessar empresários para que investissem no aperfeiçoamento de seus aparelhos, portanto os primeiros experimentos de Marconi já eram alvo de pesquisas no Brasil. Em virtude de brilhante êxito de suas experiências inéditas, em nível mundial, Landell obteve em março de 1901 a patente brasileira nº 3279 para “Aparelho destinado à transmissão phonética à distância, com fio ou sem fio, através do espaço, da terra e do elemento aquoso”. O mérito do Padre Landell é ainda maior se considerarmos que desenvolveu tudo sozinho.

Esta patente brasileira descreve o funcionamento do que Landell chamava de tellogostomo e do telauxiophone. O tellogostomo possui um disco de ferro galvanizado, um tubo acústico e bocal, cilindro compulsor e ventoinha em frente de um pequeno fotóforo. As vibrações sonoras são misturadas à corrente de ar gerada pela ventoinha e assim reforçadas. O receptor é um aparelho igual ao precedente, com a posição do cilindro compulsor invertida. “Depois de haver posto os dois aparelhos distanciados, bem em frente um do outro, posto em comunicação com a terra os dois fios que partem do cilindro do compulsor e do fotóforo, põe-se em movimento o compulsor e pelo tubo acústico fala-se e ouve-se; notando, porém, que para se ouvir, faz-se preciso, parar o compulsor ou retirá-lo”. O telauxiophone possui construção similar, no entanto prescindindo do óculo de alcance, da bússola, do nivelador, do compulsor, do fotóforo, do tubo acústico, mas com um microfone mais amplo, como também uma bobina de indução maior em um fone especial, para melhor audição. Com este aparelho obtém-se todos os efeitos da telefonia comum, porém, com mais nitidez.

Esta patente brasileira, descreve apenas a construção mecânica do aparelho, e ao tratar de sua utilidade cita: Com este aparelho pode-se projetar pelo espaço a voz a distâncias bem regulares. Funciona com sol, chuva, tempo úmido e forte cerração”, ou seja, ao que parece trata-se de um megafone aperfeiçoado, que projeta a voz a grandes distâncias. O documento apenas cita como possibilidade que “pode-se ouvir também pelo fone, contanto que ao aparelho se adapte um microfone assaz sensível ou se adote a teoria da radiofonia ou fotofonia, como também telegrafar sem fio, usando do tubo de Branly e do produtor de ondas elétricas” sem mais detalhes, ou seja a patente brasileira não versa sobre a mesma matéria das patentes depositadas nos EUA, tampouco trata do mesmo equipamento utilizado na citada apresentação pública de 1900.

Consciente de que suas invenções tinham real valor, o padre Landell partiu com destino aos Estados Unidos da América, em julho de 1901, quatro meses depois de concedida sua patente no Brasil, com o intuito de patentear os seus aparelhos e tem sua história publicada em 12 de outubro de 1902 no jornal New York Herald (de onde provém a única foto que temos de Landell de MouraA bobina de Ruhmkorff consiste de um primário e um secundário de muitas voltas em aberto, terminado por duas esferas próximas, de modo que quando uma pequena tensão é aplicada ao primário, uma tensão elevada surge no secundário, o que dá início a um centelhamento devido à proximidade das esferas. No caso de transmissão de ondas eletromagnéticas, o circuito de detecção utilizado na época era o circuito coesor-descoesor de Branly. Os sinais de audio transmitidos dessa forma não eram perfeitos, uma vez que se tinha a informação de freqüência (o interruptor fonético não era nada mais que uma chave, operada pela voz,que fechava ou interrompia um circuito, na freqûencia da voz humana), mas não a de intensidade sonora.

O sinal de luz após a passagem por este segmento da câmara está portanto modulado, pelo sinal de áudio. Este transmissor com modulação de luz e detecção por células de selênio não fora contudo uma inovação de Landell, mas de Bell, através do “photophone”, que utilizava de espelhos móveis. Bell não levou o projeto adiante dado ao pequeno alcance atingido e acabou por não ver uma utilização prática daquela invenção. Landell, com sua enorme criatividade deu poder ao Radio de Luz, utilizado por Bell, utilizando uma potente fonte geradora de luz, através do arco voltaico, concentrando os raios gerados a partir do foco de uma superfície parabólica, redirecionando-os perpendicularmente ao eixo que une o foco da superfície parabólica ao seu centro. Com isso conseguiu aumentar consideravelmente a distância de transmissão, comparado com alguns metros conseguidos por Bell, com seu “photophone”.

Fala-se incorretamente em alguns livros que Landell já teria inventado o tríodo antes de Lee De Forest, no entanto o que Landell utilizou foi o tubo de Crookes, que tem um acelerador de elétrons, mas não tem um meio de controlar o fluxo de elétrons, que é o caso das válvulas amplificadoras, onde com uma tensão variável entre grade e catodo, consegue-se controlar o fluxo de elétrons entre catodo e placa. Da mesma forma, alguns autores atribuem a Landell o pioneirismo do princípio das fibras óticas, ao propor a modulação dos sinais de luz, para transmissão de dados, mas como já observado, este princípio já havia sido exposto no photophone de Bell.

O tubo de Crookes foi inventado em 1869 e possui em seu interior gases rarefeitos que emitem raios luminescentes, quando se aplica entre os dois eletrodos do tubo, uma alta tensão. O tubo de Crookes é usado por Landell nos aparelhos de transmissão de telegrafia e de telefonia, ambos de esquemáticos muito semelhantes. Uma bobina de Ruhmkorff excita o tubo de Crookes, para que se produzam os pulsos de luz. Uma novidade da patente, segundo Landell seria que a luz do tubo de Crookes (emitida continuamente) e as ondas hertzianas (chaveadas pela bobina de Ruhmkorff e telégrafo Morse) interagiam, reforçando o sinal: “Os raios catódicos, produzidos pelo tubo de Crookes, são naturalmente refletidos pelo espelho e seguem a direção geral do eixo da armação. Esses raios catódicos, como as ondas actínicas e etéricas acima descritas [geradas pela bobina de Ruhmkorff], aparentemente se reforçam umas às outras em seus efeitos, e o resultado é que o telégrafo é mais eficiente quando todas as radiações são empregadas. Os raios catódicos emitidos em oscilação contínua, não são controlados diretamente pela chave transmissora. Apenas as ondas hertzianas são controladas pela chave [Morse]; com os raios catódicos ?(tubo de Crookes) apenas facilitando a propagação das ondas hertzianas”.

Quando Landell em 1901 partiu com destino aos Estados Unidos com o intuito de patentear seus aparelhos imaginava que sua estada no país do norte seria aproximadamente de uns seis meses. No entanto os técnicos da U.S.Patent Office em Washington exigiram que fossem construídos os protótipos de seus aparelhos e que fosse demonstrado que efetivamente funcionavam segundo as descrições contidas nos memoriais descritivos (as patentes contudo apresentam a inscrição NO MODEL, o que sugere que os modelos não ficaram guardados no USPTO). Landell não levou os aparelhos que já tinha construído pois simplesmente segundo os registros dos livros eles teriam sido destruídos por uma leva de incultos fanáticos que o viam como alguém que tinha parte com o demônio…Isso acabou por tomar muito mais tempo, pois sabemos que as patentes só foram conseguidas em 1904. Patriota, Landell nega-se a receber os lucros que a fama estava por colocar a seus pés. Empresários americanos se enfileiram para apadrinhá-lo porém ele nega-se a aceitar. Diz textualmente: “Esses inventos não me pertencem; por mercê de Deus sou apenas o depositário deles. Vou levá-los à minha pátria, o Brasil, para que, de lá, sirvam à Humanidade.”

Logo depois voltava ao Brasil e o “Jornal do Comércio” dava-lhe oportunidade para descrever as suas invenções na transmissão do rádio. Segundo o biógrafo de Landell, Otto Albuquerque, autor de “No ar a luz que fala”, como consequência das suas descobertas, a Marinha de Guerra do Brasil, logo no retorno de Landell de Moura dos Estados Unidos, em 1º de março de 1905 realizava experiências com a telegrafia por centelhamento, no encouraçado Aquidaban. Esta versão entretanto, não é confirmada pelo pesquisador Rodrigo Moura, ao encontrar notícias do Jornal do Comércio da época, que mencionam a utilização de equipamentos de rádio importados pela Marinha e utilizados à essa época no Aquidaban.

Ernani Fornari nos dá uma versão pela qual um dos Oficiais de Gabinete do Presidente Rodrigues Alves, perguntou ao Padre Landell qual seria a distância desejada por ele para que dois navios trocassem suas mensagens e a resposta parecia mesmo a de um louco: “A distância máxima possível. As que quiserem ou puderem. Os meus aparelhos podem estabelecer comunicação com quaisquer pontos do planeta, os mais afastados que estejam uns dos outros. Isto atualmente, porque no futuro servirão até mesmo para comunicações interplanetárias”. Eis a impressão que teve o Oficial de Gabinete do Presidente Rodrigues Alves: “Excelência, o tal padre é totalmente maluco. Imagine que ele chegou até a falar-me em conversar com habitantes de outros planetas”. No dia subsequente, uma carta amável da Secretaria da Presidência da República informava ao egrégio brasileiro não ser possível no momento, lamentavelmente, atender seu pedido, devendo Ele, por isso, aguardar a oportunidade… Por esse mesmo tempo, o Governo italiano, que já em 1902 cedera a Marconi a belonave “Carlo Alberto”, punha toda a sua esquadra à disposição do jovem eletricista bolonhês.

De qualquer forma, segundo Henry Barros, a Marinha foi a pioneira da radiotelegrafia no Brasil. Em 1903 a Marinha já estudava a implantação da radiotelegrafia em seus serviços, isso no tempo em que era Ministro da Marinha o contra-almirante Júlio César de Noronha. Os pioneiros eram os oficiais Armando Roxo, Octavio Perry, Marques de Azevedo e Tácito Rego, entre outros. Duas estações do tipo Telefunken, que operavam por centelhamento, tal qual o rádio de Landell de Moura, foram montadas na Ilha das Cobras, no recinto do Batalhão Naval, que começaram a funcionar em regime de experiência em 1904. Nos mesmo ano foram montadas estações, também do tipo Telefunken, nos navios Aquidaban, Barroso, Riachuelo, Tamoyo e Benjamin Constant. Em janeiro de 1906 o encouraçado Aquidaban, explodiu na enseada de Jacuecanga, tendo a bordo uma comissão de radiotelegrafistas (o local do naufrágio hoje é um ponto de mergulho próximo a Ilha Grande/RJ). Já em 1910, na revolta dos marinheiros, todos os navios possuíam serviço de rádio e os revoltosos trocavam telegramas entre os navios e o Governo, dado ciência de suas exigências. È natural que este pioneirismo tenha sido da Marinha, porque as ligações antigas, com fio, eram inviáveis a bordo de navios em movimento.

O exército brasileiro por sua vez em 1913 contrata a Companhia Brasileira de Eletricidade (Siemens) a instalação de estações radiotelegráficas no QG do exército, no forte de Imbuí e nas Fortalezas da Lage, Santa Cruz e São João, os quais de acordo com o Aviso Ministerial de 7 de março de 1913 são colocadas sob a fiscalização do inspetor de Fortificações do Litoral da República. Em 30 de outubro de 1914 essas estações são entregues ao Exército e entram em operação. Novas estações são construídas pelo Aviso Ministerial 1243 de 23 de agosto de 1915, pelo então Ministro da Guerra, Gen. José Caetano e Faria, o que viria a ser o embrião do atual Serviço de rádio do Ministério do Exército.

Segundo Landell todo movimento vibratório que pode ser transmitido por um condutor poderá ser transmitido por um feixe luminoso: “Todo movimento vibratório que até hoje, como no futuro, pode ser transmitido através de um condutor, poderá ser transmitido através de um feixe luminoso, e por esse mesmo fato, poderá ser transmitido sem o concurso desse agente”, ousando a postular: “Dai-me um movimento vibratório tão extenso quanto a distância que nos separa deste e de outros mundos, que giram sobre nossas cabeças ou sob nossos pés e eu farei chegar minha voz até lá”. Em 1907, o Padre Landell de Moura, sob a designação de O Perianto, descrevia minuciosamente os efeitos eletro luminescentes do que acreditava ser a aura humana e sua gravação em filme fotográfico, efeito que em 1939 viria a ser conhecido, na Rússia, sob a denominação de efeito Kirlian, ainda sem comprovação científica.

Em 1908 Landell voltou ao Rio Grande do Sul onde dirigiu a paróquia do Menino Deus, em 1916 retornou a paróquia de Nossa Senhora do Rosário, onde fora batizado. Landell também chegou a ser professor da Faculdade de Medicina Homeopática do Rio Grande do Sul. Em 17 de setembro de 1927 foi elevado, pelo Vaticano, a Monsenhor, e seis meses antes de falecer nomeado Arcediago, promoções que lhe foram feitas merecidamente. A Igreja Católica, reconhecendo e apoiando o seu trabalho como cientista, concedeu-lhe permissão especial para viajar aos Estados Unidos da América, onde permaneceu por quatro anos para patentear seus inventos. Aos 67 anos, no dia 30 de junho de 1928, morreu, abatido pela tuberculose, num modesto quarto da Beneficência Portuguesa de Porto Alegre, cercado apenas por seus parentes e meia dúzia de amigos fiéis e devotados. “Tenho a consoladora esperança de que minhas obras científicas brilharão como o sol, devido à sorte de outros inventores, mais afortunados do que eu” Em julho de 2002 foram transladados os restos mortais do padre Roberto Landell de Moura para um altar lateral da Igreja Nossa Senhora do Rosário na rua Vigário José Inácio, 402, em Porto Alegre/RS.

A história do rádio no Brasil, teve continuidade, pelo desenvolvimento de equipamentos conforme o modelo preconizado por Marconi. A primeira transmissão de rádio realizada oficialmente no Brasil ocorreu no dia 7 de setembro de 1922, durante a inauguração da Exposição do Centenário da Independência na Esplanada do Castelo, com as estações experimentais da Westinghouse no Corcovado e da Western Eletric na Praia Vermelha. Foi um grande acontecimento. O público ouviu o pronunciamento do Presidente da República, Epitácio Pessoa, a ópera O Guarani, de Carlos Gomes, transmitida diretamente do Teatro Municipal, além de conferências e diversas atrações. Muitas pessoas ficaram impressionadas, pensando que se tratava de algo sobrenatural. Roquete Pinto inaugurou em abril do ano seguinte a PRA 30, Rádio Sociedade do Rio de Janeiro, a primeira emissora do país. As duas datas são usadas para comemorar a chegada do rádio ao Brasil. Em 1926, José Jonotskoff de Almeida Gomes, construiu o primeiro radiotransmissor em ondas curtas (prefixo PPW) de que se tem notícia no Brasil, na Cia. Rádio Telegraphica Brasileira – Radiobrás (companhia multinacional, com sede em Paris e ligada a RCA), ex trans rádio. Com válvulas importadas Marconi, circuito push-pull com corrente alternada na placa, potência de 100W e frequência de 15 MHz, (20m), que permitiu a Radiobrás colocar em tráfego realmente comercial os telegramas que se estavam acumulando devido ao baixo rendimento do equipamento de onda extralonga (18KHz – 20Km) de fabricação francesa da SFRE.

Apesar da invenção do Gugliemo Marconi ter sido tecnicamente inferior e posterior a do brasileiro Landell de Moura, foi ele o primeiro a receber a patente do transmissor de ondas, em julho de 1897, nos Estados Unidos (US 586193, patente depositada em dezembro de 1896). Landell de Moura só teve suas patentes concedidas em 1901, no Brasil, e em 1904, nos Estados Unidos. Mas aí, já era tarde, e a posição oficial de criador da Radiodifusão tinha sido ocupada pelo italiano. Marconi recebeu o prêmio Nobel de Física de 1909, por suas contribuições para o desenvolvimento do telégrafo sem fio.

Segundo o engenheiro Luiz Netto, na patente de Marconi de 1897, o primário de uma bobina de Ruhmkorff é alimentado por uma bateria de acumuladores e pode ser fechado ou aberto por um interruptor, tendo a forma de uma chave telegráfica Morse. O secundário da bobina está ligado a um explosor, cujas bolas, por sua vez se ligam respectivamente à antena e a terra. No receptor uma antena termina num dos eletrodos de um coesor, montado no circuito à maneira do sistema de Popoff. Duas bobinas de autoindução impedem, em virtude de suas grandes resistências indutivas, passem as oscilações para o circuito derivado, onde se acha montado um registrador Morse comum, com a sua bateria de pilha. Marconi, portanto aperfeiçoou o coesor, ligou-o a uma antena e inseriu o manipulador telegráfico no circuito. Comparando-se com as patentes de Landell, observa-se portanto que o invento de Marconi, tem funcionamento distinto.

Em 1897, Marconi cria sua própria empresa: a British Marconi. Ela comercializava sistemas de rádio e telegrafia, que passaram a equipar sobretudo os navios das marinhas mercantes e de guerra que os adquiriram. Em 1899, Marconi viria a utilizar circuitos sintonizados no transmissor e receptor, permitindo a instalação de mais de uma estação de rádio num mesmo lugar, algo impossível pelos rádios anteriores (como os do equipamento de Landell) pois a transmissão de um necessariamente seria captada por todos os demais (objeto de uma nova patente concedida em abril de 1900 na Inglaterra, e depositada nos Estados Unidos em novembro de 1900 e concedida em junho de 1904, após o grande impacto comercial de suas transmissões transatlânticas de 1901) utilizando circuitos sintonizados na recepção, para estabelecer, a 28 de Março, uma comunicação radiotelegráfica através do Canal da Mancha, entre Wimereux e Douvres (50 kilometros). Dois anos mais tarde, em dezembro de 1901, Marconi passou a viver nos Estados Unidos e realizou a primeira transmissão transatlântica (one way) em código Morse – da Inglaterra enviou de sua estação Poldhu, através do Atlântico, três sinais do telégrafo (SOS) para a outra estação Newfoundland nos Estados Unidos e fundou a American Marconi, que se tornou líder em vendas equipando a maioria dos navios e sistemas de sinalização da costa americana.

 

Assim a invenção do rádio é atribuída a Loomis para os americanos, Hertz para os alemães, a Branly pelos franceses, a Popov pelos russos, a Marconi pelos italianos, a Lodge pelos ingleses. Para os brasileiros, esta primazia cabe ao Padre Roberto Landell de Moura, por seu pioneirismo nas telecomunicações, considerado o Patrono dos Radioamadores Brasileiros. O CPqD – Centro de Pesquisa e Desenvolvimento Padre Landell de Moura, foi criado em 1976 com o objetivo de desenvolver equipamentos para o Sistema Telebrás, seu nome é uma homenagem ao padre.

 

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http://lepto.procc.fiocruz.br:8081/dic/verbetes/FACMEDHORS.htm

acesso em abril de 2003

 

http://www.abc.org.br/historia/h_morizet3.html

acesso em maio de 2003

 

http://www.smecc.org/mhlon_loomis.htm

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http://earlyradiohistory.us/1922hou.htm

acesso em novembro de 2003

 

História Geral das Telecomunicações no Brasil, Henry Barros, cadernos da TELECOM Vol. 1 , 1989, páginas 15, 105 e 110

Ísis sem véu, Helena Blavatsky, Ed. Pensamento, Volume 1, 1995, página 204 e 244

 

No ar, a luz que fala, Otto Albuquerque, FEPLAM, Porto Alegre

http://www.mediahistory.umn.edu/time/1890s.html

acesso em março de 2005

http://pt.wikipedia.org/wiki/Landell_de_Moura

acesso em agosto de 2007

http://www.mlm.landelldemoura.qsl.br/

acesso em julho de 2009

Agradeço a contribuição dos pesquisadores da vida do Padre Landell, Luiz Netto ([email protected]) autor de todos os esquemáticos das invenções de Landell mostrados nesta página e Ivan Dorneles Rodrigues ([email protected]) pelo material enviado.

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