Elmo Francfort Ankerkrone relata a saga de pioneiros da televisão paranaense membros de sua família:
Conforme o que Seu Olavo contou para os colegas da TV Paranaense, ele havia construído uma câmera em 1945, cinco anos antes da TV Tupi entrar no ar…Isso porque a TV Tupi foi a primeira da América Latina. Mas voltando à câmera, ele a construiu em Juiz de Fora (MG), sua cidade natal. E chegou a transmitir um jogo de futebol na época. Imaginem que nenhuma emissora do exterior ajudou-o nesse evento.Ele inventou e fez. Foi assim, que fantasticamente, através da Rádio Industrial de Juiz de Fora este pioneiro do mundo transmitiu o tal jogo de futebol entre os times Tupi (MG) e Bangu (RJ). Conforme a descrição de Seu Olavo, a câmera foi feita em sua casa, constituída por chapas de zinco e com válvulas de rádio compradas com praticamente todo dinheiro que ganhava, deixando até de comer, para poder montar aquela câmera. Conforme o livro “Almanaque da TV” de Ricardo Xavier, a Rádio Industrial de Juiz de Fora, sob a direção de Alceu N. Fonseca transmitiu a partir de 29 de setembro de 1948 imagens com a câmera de Olavo Bastos Freire (os dados não batem com o que ele contou aos colegas da Paranaense) e os eventos foram patrocinados por Carlos Pereira Indústrias Químicas, realizando uma programação variada.
Quando Seu Olavo saiu de Juiz de Fora foi para o Sul, onde conheceu os profissionais da Rádio Paranaense. Daí surgiu a oportunidade e a ideia de ingressarem no ramo televisivo. Mas Olavo não se desfez de sua invenção e levou-a para a TV Paranaense. Meu tio Luiz Francfort desabafa: “Eu via essa câmera num quartinho depósito da TV Paranaense, quase todo dia, e não tinha ideia do inestimável valor que ela tinha. É imperdoável. Eu mesmo, na época em que vivenciei isso, não dei a devida importância. Ao entrar em contato com o público e profissionais do ramo, me sinto na obrigação de chamar a atenção para isso, na esperança que alguém se lembre de mais detalhes, para que possamos registrar e fazermos justiça a esse excepcional homem de TV, esquecido por nós.”
Permitido pelo Ministério das Comunicações, a TV Paranaense é registrada como emissora em fase comercial em 29 de outubro de 1960, que muitos consideram como data de fundação da emissora. Quando entrou no ar a TV Paranaense, canal 12 de Curitiba e primeira emissora do Estado do Paraná, Luiz Francfort e sua irmã Alzira (minha mãe) foram trabalhar na emissora. Foi assim que ao conheceram toda equipe do canal do Senhor Nagib Chede, acabaram por conhecer Seu Olavo. Ali na Rua XV de Novembro em Curitiba, no último andar do Edifício Tijucas (aonde a TV Paranaense nasceu) ficava um senhor muito magro, que pouco falava, mas que era um cavalheiro ao se relacionar com as outras pessoas – chegava a chamar atenção pelo cuidado com que Seu Olavo possuía com os outros. “Doutor Olavo” como os outros o chamavam na Paranaense era um técnico, que instalou todo o equipamento de estúdio e até os transmissores da emissora. O que mais impressionava as pessoas é que Seu Olavo ficava horas e horas, várias madrugadas acordado trabalhando em silêncio e praticamente sem comer.
Olavo na época estava entre 50 e 60 anos. Nunca perguntaram sua idade, mas presumiam que era esta. Mas minha mãe afirma que a lembrança pode estar nos traindo, já que ela afirma que com o passar do tempo a concepção de idade muda. Este inventor chegou a ficar um mês inteiro fazendo uma um aparelhinho para ligar o transmissor da TV. Poderia ser considerado o primeiro “controle-remoto” do mundo ou talvez o primeiro e único controle-remoto de ligar um transmissor de televisão. Um capítulo importante deste pioneirismo da TV Paranaense foi quando ocorreu o Congresso Eucarístico no bairro Centro Cívico, que o canal 12 realizou um feito que até hoje causa surpresa para os que escutam falar dele.
O “Doutor Olavo” como os colegas chamavam o primeiro câmera da América Latina e do Brasil, ficou a noite inteira mexendo com os aparelhos na salinha perto do transmissor. E todos estavam preocupados com a cobertura do Congresso Eucarístico, onde ele era o coordenador. Mas a emissora precisava ao mesmo tempo ser colocada no ar por ele. E como ele estaria nos dois lugares ao mesmo tempo? Foi quando no dia ele apresentou um controle-remoto a equipe (algo inédito no mundo!) e em um click colocou no ar a emissora, num raio de 1 km. Eram 6 horas da noite e a emissora entraria no ar entre uma a duas horas depois com programação. Nunca ninguém havia feito aquilo. E hoje é um perigo se utilizar um sistema desse tipo para ligar um transmissor de TV.
E foi assim gerado o Congresso Eucarístico nó fim da Rua Barão do Serro Azul (quem diria, na rua com o nome do tio-tataravô), próximo ao Passeio Público e aonde hoje se encontra o Shopping Müller. Havia uma imitação das catacumbas romanas onde os católicos se escondiam. Gravaram tudo! A Paranaense, ao contrário das várias emissoras da época (até a Tupi) possuía uma pequena câmera da RCA, de alta tecnologia, um pouco maior do que as pequenas câmeras domésticas de hoje. E em 11 de maio de 1960 acabou o estágio de meu tio na Macife e minha mãe havia recebido sua carteira de motorista (que tirou em Curitiba, depois de treinar na direção por várias vezes nas ruas do Batel). Deixavam para trás lembranças e saudades da antiga Curitiba. E entre 1961 e 1962 Alzira e Luiz apareceram novamente em Curitiba. Aproveitaram e foram visitar a TV Paranaense. O amigo Renato Mazanek disse que Seu Olavo estava fazendo uma nova invenção, que tinha o tamanho de um armário, de uma geladeira (1, 80m de altura e 70 cm de largura)… E foram lá ver na emissora o que ele estava criando. Chegando lá Olavo Bastos Freire mostrou aos dois um enorme sintetizador sonoro, que emitia notinhas… Acreditem, ele estava criando um protótipo de um teclado, já que através daquele maquinário na época Seu Olavo já estava compondo um sambinha!
Por um bom tempo, as listas telefônicas de Curitiba estampavam a história de Olavo Bastos Freire no verso de suas capas. Pelo menos assim preservaram a memória deste grande inventor brasileiro. Seu Olavo não tinha nem dinheiro direito para fazer suas invenções, muito menos para registrá-las. Mas era alguém que merecia ter seus eventos registrados de graça. Ele é para televisão o que o Padre Roberto Landell de Moura foi para rádio. Só que Landell de Moura registrou a rádio, dando sérios problemas com Guglielmo Marconi por causa disso. Quem dera se Olavo tivesse todas as homenagens que merecia…E merece!
Meu tio completa: “É uma verdadeira injustiça que isso não seja divulgado e respeitado como um dos acontecimentos mais importantes da TV brasileira.” Com a saída de Renato Mazanek e dos conhecidos da TV Paranaense, não soubemos mais notícias do que aconteceu com esse nosso pioneiro inventor. Só sabemos que de tempos para cá, Seu Olavo começou a ser lembrado. A câmera dele foi levada por conhecidos ao Ministério das Comunicações em Brasília, onde hoje está exposta em seu saguão de entrada. E fica aqui mais um registro sobre o inventor de Juiz de Fora. Nós sempre faremos todos os esforços possíveis para deixar viva a imagem de Olavo Bastos Freire, um pioneiro da TV brasileira, latina e mundial.
Renato Mazanek, amigo de Olavo Bastos Freire dá seu depoimento: “Olavo além de ter construído a primeira Câmera e Transmissor de TV, desenvolveu a primeira caneta eletrônica para escrever diretamente no vídeo ( isto em 1960 no laboratório técnico da TV Paranaense Canal 12). Olavo desenvolveu, em igual período, o primeiro sintetizador eletrônico, ainda valvulado. Por esta razão, acredito que Olavo Bastos Freire foi o precursor do desenvolvimento, do circuito integrado, que era montado nu soquete das válvulas que utilizava. É imprescindível que se faça, com a maior urgência, um reconhecimento da capacidade desse monumental brasileiro. Participando em Curitiba do INSTITUTO DA COMUNICAÇÃO E DA MEMÓRIA, junto com o seu fundador: Euclydes Cardoso de Almeida, competente profissional do Rádio no Paraná, estamos iniciando a pesquisa sobre Olavo Bastos Freire .Qualquer informação poderá ser enviada para o E- Mail: [email protected] ou [email protected] Renato L. Mazânek – Rua Desembargador Vieira Cavalcanti, 1341- Mercês – Curitiba PR 80810050. “
Fonte:
http://www.sampaonline.com.br/colunas/elmo/coluna2001jul20.htm
http://www.museudatv.com.br
acesso em fevereiro de 2005
Agradeço a Elmo Francfort Ankerkrone ([email protected]) pela autorização concedida em abril de 2005 para reprodução do texto extraído de seu site, com a ressalva de que por meios legais esta autorização para a cópia do conteúdo, se limita ao inventabrasil, sem a possibilidade de uso de terceiros em qualquer mídia, seja eletrônica ou impressa
Agradeço a Renato Mazanek ([email protected]) pelo envio de seu depoimento em maio de 2005, para inclusão do site