Os defensores do desenvolvimento da biotecnologia brasileira poderão amargar novo revés caso o país continue sem uma legislação definitiva de biossegurança. A próxima vítima pode ser a pesquisa para produzir um tipo de feijão resistente à seca, que vem sendo feita pela Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) e pelas universidades federais de Viçosa (MG) e do Ceará. Os estudos para o desenvolvimento do feijão transgênico estão avançados, mas podem ser paralisados quando entrarem na fase de testes de campo, que estão praticamente proibidos em todo o país. O feijão está na base da alimentação dos brasileiros e é um dos principais produtos do semiárido nordestino. Melhorado geneticamente, defende a Embrapa, poderá resistir aos períodos de estiagem da região, atendendo principalmente à agricultura familiar de subsistência. Nos primeiros testes, os cientistas conseguiram desenvolver plantas de tabaco transgênicas que resistiram até seis semanas sem irrigação. O feijão convencional, por sua vez não aguenta mais de uma semana sem água.
Eduardo Romano, cientista da Embrapa que participa da pesquisa, explicou que essa tecnologia também pode ser utilizada em culturas como soja e cana de açúcar, de grande importância econômica para o agronegócio brasileiro. “Isso vai permitir também que se use a irrigação de forma mais racional. Com irrigações mais espaçadas, estaremos economizando água, preservando os recursos hídricos”, explicou. Mas esse trabalho pode ficar comprometido caso não sejam removidos os empecilhos à pesquisa com organismos geneticamente modificados. Na Embrapa, vários projetos estão parados por falta de licença. A pesquisa para desenvolver um tipo de feijão resistente ao “mosaico dourado”, principal vírus que afeta a cultura, está parada há três anos. Também não avança a pesquisa de uma batata resistente a doenças. Os cientistas não podem multiplicar esses organismos em laboratório e há o risco de que o material biológico seja perdido.
Foi o caso do desenvolvimento de bananas resistentes a fungos. Como os pesquisadores da Embrapa não conseguiram autorização para fazer a multiplicação das bananas no campo, todo o material biológico foi perdido. Em contrapartida, a Índia investiu em projeto semelhante, desenvolveu bananas resistentes e as patenteou. “O governo precisa tomar uma decisão. Essa tecnologia está sendo utilizada por todos os grandes produtores agrícolas do mundo. Nós temos que decidir se vamos comprar essa tecnologia de meia dúzia de multinacionais ou se vamos investir na pesquisa brasileira”, afirmou Romano. A polêmica envolvendo a liberação dos transgênicos acabou criando uma situação paradoxal. Mesmo recebendo financiamento de R$ 2 milhões da Finep (Financiadora de Estudos e Projetos), o programa de biossegurança da Embrapa está parado porque os cientistas estão proibidos de testar no campo os produtos desenvolvidos pela empresa. O programa envolve mais de cem pesquisadores que deveriam fazer a análise da segurança alimentar e ambiental dos produtos desenvolvidos em laboratório. A necessidade de investir nesse tipo de estudo antes de liberar os transgênicos é justamente uma das principais reivindicações dos ambientalistas.
Fonte: JORNAL VALOR ECONÔMICO DATA: 23/01/04 ON-LINE Feijão transgênico depende de legislação definitiva