“Anti-Inflamatório”

O primeiro medicamento sintetizado e patenteado exclusivamente em território nacional. Trata-se de um antiinflamatório, já testado com sucesso em animais, elaborado pelo médico farmacologista Gilberto De Nucci. O projeto foi desenvolvido por uma parceria entre o Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo (USP), onde De Nucci é professor, e os laboratórios farmacêuticos Aché. O novo antiinflamatório só chegará ao mercado quando terminarem os testes em humanos, que devem começar em 2001. Seu lançamento está previsto para 2003. Como vantagens, o medicamento apresenta ótimos efeitos analgésicos e uma boa tolerância gástrica – a irritação estomacal constitui um dos principais efeitos colaterais dos antiinflamatórios existentes atualmente. 

O princípio de funcionamento desse tipo de remédio está na inibição de duas enzimas celulares fundamentais durante o processo antiinflamatório: a ciclooxigenase (COX) 1 e 2. A primeira transforma ácido araquidônio (tipo de ácido graxo de origem alimentar localizado nas membranas celulares) em prostaglandinas, mediadoras que sensibilizam as células vizinhas para uma determinada reação celular. Já a COX 2 responde ao processo por meio da dor (um sinal de perigo para o corpo) e do estímulo de inúmeras outras ações defensivas (como inchaço local). Assim como a COX 1, a COX 2 também apresenta importantes funções fisiológicas, atuando, por exemplo, na reprodução, na proteção dos rins ou da parede do estômago contra acidez excessiva. Seu total bloqueio pode trazer sérias conseqüências ao organismo, como efeitos nocivos para os rins ou úlceras estomacais. 

Como seus similares, o remédio brasileiro inibe totalmente as enzimas COX. No entanto, ele é capaz de evitar as irritações gástricas características desses medicamentos. O segredo está exatamente no desenho de suas moléculas. Para chegar a tais resultados, De Nucci desenvolveu 21 estruturas moleculares diferentes. “Construí moléculas que apresentam estruturas análogas às de outros remédios, mas com alterações em certos detalhes que mantêm e até melhoram as funções farmacológicas, permitindo o registro de uma nova patente”, descreve. Esta é uma prática comum na indústria farmacêutica; remédios produzidos assim são chamados “me too drugs”

A contribuição inicial e mais importante nesse tipo de trabalho é o desenho da estrutura atômica da molécula. “No caso da molécula do antiinflamatório, eu tinha a estrutura na cabeça, mas era preciso sintetizá-la em laboratório apropriado”, conta De Nucci. Nem a USP nem o Aché possuem um laboratório para esse fim. Para realizar esse trabalho de síntese, o professor De Nucci pediu ajuda a dois colegas químicos da Universidade de Nápoles, na Itália, onde ele é professor visitante. Giusepe Caliendo e Vicenzo Santagada realizaram a síntese das moléculas conforme o desenho de seu idealizador e ajudaram na caracterização da molécula nos laboratórios do ICB. 

Pela atual lei das patentes, aprovada em 1996 pelo Congresso Nacional, os laboratórios brasileiros não podem mais reproduzir fármacos patenteados no exterior como faziam até recentemente. “Antes, não havia o interesse da indústria farmacêutica nacional em desenvolver medicamentos aqui. Eles vinham prontos do exterior ou tinham suas fórmulas copiadas”, afirma De Nucci. Os investimentos para essa primeira etapa do desenvolvimento do novo medicamento são da ordem de US$ 400 mil. A Aché Laboratórios contribui com US$ 120 mil, ou 30% do total dos gastos. Os restantes US$ 280 mil foram financiados pela FAPESP. Quando o medicamento estiver à venda para a população, 5% dos royalties serão da USP. 

Além da falta de experiência comercial dos pesquisadores, as Universidades também sofrem para entender os trâmites jurídicos do patenteamento. A maior parte das pesquisas é feita em instituições públicas, o que cria problemas na hora de licenciar o uso das patentes pelo setor privado. Como a pesquisa que deu origem à inovação foi produzida com recursos públicos, seu licenciamento deveria ser feito por licitação. A Universidade também não poderia oferecer exclusividade de uso, um forte atrativo para as empresas. Uma saída é fazer convênios prévios com interessados em explorar comercialmente um invento. Foi o que faltou ao pesquisador Gilberto De Nucci e à USP, que perdeu o direito à patente de um antiinflamatório. A pesquisa foi financiada pela Fapesp e pelo laboratório Aché. “Na hora de patentear, a consultoria jurídica da USP alegou que precisaria ser feita licitação”, diz De Nucci.“Mas como o Aché já havia investido na pesquisa, não havia sentido em fazer licitação. A patente ficou toda com o laboratório.” 

Gilberto de Nucci (Campinas, SP, 18 de março de 1958) é um médico, cientista e professor universitário brasileiro, no campo da farmacologia. Seu pai foi um médico naquela cidade. De Nucci estudou medicina na Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo, em Ribeirão Preto (graduando-se em 1981), onde também realizou seus primeiros estudos científicos, no Departamento de Farmacologia, sob orientação do professor Sérgio Ferreira. Logo após sua graduação, mudou-se para Londres, Inglaterra. Trabalhou de 1982 a 1985 com Dr. John R. Vane, Prêmio Nobel de 1982 em Fisiologia e Medicina, nos laboratórios da Wellcome Research, em Londres. Sua tese de doutorado (PhD) foi realizada no Royal College of Surgeons, Universidade de Londres, em 1986, com o Prof. Salvador Moncada. De 1986 a 1988, foi cientista sênior na Faculdade de Medicina do Hospital de Saint Bartholomew, William Harvey Research Institute.

Fonte: http://www.uol.com.br/cienciahoje/chdia/n216.htm
http://www.fapesp.br/tecnolog44.htm
acesso em fevereiro de 2002 http://www.jornaldaciencia.org.br/Detalhe.jsp?id=7342 
acesso em janeiro de 2003 
http://pt.wikipedia.org/wiki/Gilberto_de_Nucci 
acesso em janeiro de 2009 

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