Pesquisadores do Instituto de Química da Unesp de Araraquara desenvolvem novos materiais a base de vidros especiais, chamados de calcogenetos, para tornar os CDs e DVDs mais eficientes e baratos. Um dos objetivos é produzir DVDs que possam ser gravados e regravados em câmaras portáteis de vídeo digital. O grupo também detectou um fenômeno que possibilita a aplicação desses materiais na fabricação de microlentes da espessura de um fio de cabelo para as áreas de segurança, em micro câmeras, na medicina, em cirurgias invasivas, e na militar, em sistemas para teleguiar mísseis. A pesquisa começou com uma tese de doutorado sobre as propriedades dos calcogenetos, material que parece um vidro muito resistente, e evoluiu para o desenvolvimento de novos materiais para discos compactos multimídia, como CDs e DVDs. Os calcogenetos têm durabilidade 25% maior do que os polímeros e poderão armazenar, com qualidade, quantidade de informações 100 vezes maior. A mudança na pesquisa foi acelerada por um prêmio, conquistado em 2001, na Romênia, pelo Grupo de Materiais Fotônicos do Instituto de Química da Universidade Estadual Paulista, do campus de Araraquara (IQ-Unesp).
“Com apenas dois anos de pesquisa ficamos em segundo lugar, num evento onde estavam equipes que trabalham neste setor há 20 anos”, comenta o químico marroquino Younés Messaddeq, coordenador do grupo da Unesp. “A vantagem, acredito, é que somos químicos, enquanto a maioria dos grupos internacionais é de físicos.” Com mestrado e doutorado na Universidade de Rennes, da França, Messaddeq veio para o Brasil em 1992, para trabalhar com amplificadores óticos na Telebrás. Em 1999, já na Unesp, orientou a primeira tese de doutorado sobre calcogenetos. Ele descobriu durante o evento de Bucareste, que haviam pesquisas para transformar esse material no substituto dos atuais polímeros utilizados nos CDs e DVDs. “Tudo depende de conseguirmos chegar a um grau de pureza de partes por bilhão (ppb)”, diz Messaddeq, explicando que a eliminação das impurezas naturais das matérias-primas ainda é o maior desafio a ser vencido. “Estamos montando um sistema, em colaboração com laboratórios russos, de destilação e refundição para chegar a um alto grau de pureza.” Hoje, a perda decorrente de impurezas do material brasileiro é de 40 decibéis por metro. Os russos prometem reduzir a perda para 0,45 decibéis por quilômetro.
Os pesquisadores brasileiros estão verificando qual a melhor composição de matérias-primas. Os grupos internacionais – japoneses e norte-americanos, sobretudo – trabalham com telúrio, gálio, germânio e selênio, enquanto a Unesp elegeu o gálio, o germânio e o enxofre. “Não queremos trabalhar com o telúrio porque é cancerígeno”, esclarece o coordenador da pesquisa. “Quanto ao melhor tipo de mistura, atualmente estamos com quatro possibilidades e ainda não sabemos qual vai prevalecer”. O grupo conta com a colaboração do Instituto de Física da USP, do campus São Carlos, e obteve financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), no valor de R$ 90 mil para custeio de pesquisa e US$ 120 mil para a compra de equipamentos. A equipe envolve hoje cerca de 30 pesquisadores e pós-graduandos. Por enquanto, eles ainda estão concentrados no estudo das características dos calcogenetos e seu comportamento, mas devem iniciar, em breve, as pesquisas mais profundas sobre as aplicações dos materiais. A estimativa é de chegar a algum resultado passível de utilização comercial em 5 anos.
Se hoje um disco compacto (CD) pode armazenar cerca de 240 milhões de bytes, o equivalente, por exemplo, a 300 mil páginas de texto escrito em espaço duplo, a perspectiva para os próximos anos é aumentar essa capacidade para 10 bilhões de bytes, 41 vezes maior que a atual, ou ainda 12,3 milhões de páginas. Além de dominar o mercado de gravação de música, o CD é também o meio padrão para aparelhos multimídia, que combinam texto, imagens e som, além de sua evolução, o disco digital versátil ou disco de vídeo digital (DVD). Assim, aumentar a quantidade de memória sem ampliar o tamanho do disco são duas linhas estratégicas de pesquisa nessa área de sistemas óptico-eletrônicos de armazenamento digital de informações. Nesse sentido, o grupo de Materiais Fotônicos do Departamento de Química Geral e Inorgânica do Instituto de Química da Universidade Estadual Paulista (Unesp), em Araraquara, tem produzido novos materiais e feito importantes descobertas sobre os mecanismos de gravação e desgravação de DVDs. Sob a coordenação dos professores Younes Messaddeq e Sidney José Lima Ribeiro, o grupo estuda fenômenos fotoinduzidos por lasers em calcogenetos, vidros especiais que possuem excelentes propriedades – no nível nanométrico – para o registro de informações digitais e imagens holográficas.
Trabalhando com esse material, eles também descobriram outros mecanismos que explicam as mudanças estruturais verificadas nos calcogenetos, quando expostos à irradiação de luz, especialmente em composições à base de gálio, germânio, enxofre, sulfeto de arsênio e antimônio. Um dos fenômenos observados é o da fotoexpansão, que provoca o aumento do volume do material, sem nenhuma alteração térmica, apenas com a luz do laser. Essa técnica possibilita também a aplicação desses vidros especiais na fabricação de microlentes da espessura de um fio de cabelo para as áreas de segurança, em microcâmeras; na medicina, em cirurgias invasivas; e na militar, em sistemas para teleguiar mísseis. A importância dos experimentos realizados em Araraquara estão num projeto piloto apresentado no ano passado por pesquisadores da Matsushita Eletrical Industrial, desenvolvido no Japão, que demonstrou o uso do DVD em câmeras digitais para gravação, de forma similar a uma fita de vídeo. A matéria-prima usada nesse DVD foi à base de calcogenetos compostos por germânio, telúrio, antimônio e enxofre. Atualmente, existe uma corrida tecnológica mundial para o desenvolvimento desses materiais. Além da caracterização dos lasers que fazem a leitura dos sinais elétricos contidos nos disquinhos, os cientistas pesquisam novos métodos e materiais, para tornar os produtos mais eficientes e baratos. Assim, filmes finos preparados a partir de vidros especiais são promissores para substituir, com vantagens, os polímeros usados atualmente na fabricação de CDs e DVDs.
Os calcogenetos garantem ao produto três pontos chave para o desenvolvimento da tecnologia de produção do DVD: estabilidade, reversibilidade (a capacidade de gravação e regravação no mesmo disco) e sensibilidade para o armazenamento de dados. Atualmente, o princípio de mudança de fase reversível (que permite gravar, apagar e regravar) é atribuído à indução foto térmica, a partir de variações de temperatura de lasers que mudam o estado desses vidros especiais de cristalino para amorfo (não cristalizado) e vice-versa. Na fase amorfa, o material grava os dados; na cristalina, reproduz. Os pesquisadores da Unesp acreditam que o melhor aproveitamento dos calcogenetos se dará com o uso do fenômeno de foto expansão. Usando um laser com potência e tempo de exposição adequados, eles verificaram que a amostra vítrea irradiada com luz ultravioleta gerou uma expansão na superfície do material da ordem de 25%. Esse índice, que aumenta o espectro de atuação, tornando o raio da lente maior, possibilita armazenar mais informações, de forma superior à observada em outros tipos de vidros calcogenetos recebendo outras intensidades de luz, que mostraram variações de expansão máxima de 0,7%. Esses resultados foram apresentados no Primeiro workshop Internacional de Calcogenetos Amorfos e Nano estruturados, em Bucareste, na Romênia, em 2001, recebendo o prêmio de segundo melhor trabalho na área. “Esse prêmio e o reconhecimento internacional nos deram motivação para aprofundar mais esses estudos, com o objetivo de desvendar outras propriedades desses materiais e desenvolver filmes finos para serem aplicados no avanço da tecnologia de DVD”, diz Messaddeq.
Fonte: http://www.estadao.com.br/educando/noticias/2003/abr/29/209.htm
http://www.ipt.br/tecnologia/btday/competencias/
acesso em setembro de 2003