“Celular Germinável”

No começo de dezembro de 2004, um grupo de pesquisadores britânicos ganhou o noticiário apresentando um celular “plantável” -uma capa de plástico biodegradável com uma semente de flor dentro, que germinava após o descarte. Agora, um designer brasileiro diz que a ideia pode ter sido plagiada de sua dissertação de mestrado, feita na Itália e disponível na internet desde junho. Belmer Negrillo, paulista de 29 anos, foi em 2002 para Ivrea, norte da Itália, fazer mestrado em tecnologia aplicada ao design (design interativo) no Interaction Ivrea, um instituto financiado pela Telecom Itália. Sua dissertação, intitulada “Appetite for Technology” (“Apetite para Tecnologia”, em inglês), apresenta objetos como uma luminária de pão e um CD de massa de macarrão.

 

Um dos capítulos da tese, desenvolvida a partir de setembro de 2003 e defendida em junho deste ano, tem o título de “Mobile.Seed, a Proposal” (“Celular Semente, uma Proposta”), no qual detalha o projeto de um telefone celular feito de um biopolímero -uma espécie de plástico biodegradável- que contém em seu invólucro uma semente de flor. A semente fica protegida por uma janela de plástico transparente, à vista do usuário. Em vez de descartar o celular e receber uma semente de flor no posto de reciclagem, como acontece hoje na Europa, o usuário literalmente plantaria seu telefone. Dentro de alguns dias, a degradação do plástico alimentaria a semente, fazendo a planta brotar. A tese pode ser lida na internet.

 

Negrillo diz ter ficado chocado ao ler nos jornais, na última quarta-feira, que um grupo da Universidade de Warwick, no Reino Unido, havia apresentado à imprensa um projeto exatamente igual: uma carcaça de telefone celular contendo uma semente numa janela de plástico que germinava ao ser plantada. “O conceito é exatamente o mesmo, o que é preocupante se considerarmos que esta ideia não foi atingida por um pensamento lógico linear”, disse o designer à Folha. “A capinha biodegradável é um raciocínio linear. Muita gente tem trabalhado nisso. Mas a mecânica de fazer isso com uma flor é uma ideia especial.” Negrillo diz ter pensado no “biocelular” a partir de janeiro. “Eu sempre tive rejeição a telefone celular. Tanto que não tenho um até hoje”, conta, dizendo que não quis criar uma necessidade. Dessa birra nasceu o conceito do “Mobile Seed”, que foi até testado “em campo” – num vaso com terra- com um polímero à base de amido disponível comercialmente, que o designer brasileiro diz não ter resistência suficiente ao calor e a deformação.

 

Ainda na tese, ele prevê que o invólucro reciclável esteja no mercado em 2008 e um telefone celular 100% biodegradável surja em 2025. Ele não patenteou a invenção: disponibilizou sua dissertação de mestrado publicamente. “Um pedido de patente na Itália custa 10 mil”, afirma Negrillo. “Estou muito aborrecido com essa história. Esse designer não teve nem a decência de me contatar”, dispara o britânico Kerry Kirwan, de Warwick. Segundo o pesquisador, a ideia do celular biodegradável surgiu em janeiro de 2003, numa conversa dele com um pesquisador da PVAXX, empresa de materiais de ponta que desenvolveu o plástico. “Nós temos documentação formal de janeiro de 2003, quando pedimos dinheiro ao governo britânico para o desenvolvimento. É estranho, do meu ponto de vista, que o designer não tenha me contatado diretamente. Também houve publicações dos EUA que saíram no ano passado”, afirmou, ameaçando acionar o departamento jurídico da universidade para “cuidar” de Negrillo. “Acho que o que eles começaram a fazer em 2003 foram os plásticos”, diz o brasileiro.

 

Fonte:

http://people.interaction-ivrea.it/b.negrillo/thesis/Belmer-Appetite2004screen.pdf

acesso em dezembro 2004

JORNAL FOLHA DE SÃO PAULO DATA: 04/12/04 ON-LINE, Cláudio Ângelo, Designer afirma que grupo britânico que apresentou um telefone “germinável” pode ter plagiado sua idéia

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