“Cirurgia de Jatene”

“Foi a maior emoção de minha vida”, lembrou o prof. Jatene , diretor geral do Incor ao contar como foi recebida a sua apresentação para quase 400 chefes de serviços de cardiologia reunidos no Henry Ford Hospital, em Detroit, em 1975. Foi em apenas dois minutos, concedidos graças ao entusiasmo do Dr. Kiaklin. Um dia antes ele havia recebido uma cópia do trabalho “Anatomic correction of transposition of the great vessels”. Em maio de 1975 no Congresso Brasileiro de Cardiologia realizado em Salvador, a técnica de transposição de grandes artérias para correção do septo interventricular, uma cardiopatia congênita, foram apresentada sem despertar grande reação. Mas para o cardiologista Alberto Benchimol, brasileiro radicado nos EUA, a nova técnica pareceu extraordinária e foi ele que insistiu para que o trabalho fosse publicado urgentemente e em inglês na revista Arquivos Brasileiros de Cardiologia “A próxima edição já estava na gráfica, mas quando eu fui falar com o editor Wanderley Nogueira da Silva, a recepção não poderia ter sido melhor. Eu havia operado o pai dele e ele simplesmente me disse que faria o que precisasse. O texto foi publicado e mandado para todos os cirurgiões. Foi assim que eu consegui dois minutos para um comentário na reunião em Detroit”, lembra o Dr. Jatene.

 

A cirurgia Jatene ou switch operation foi ovacionada pela plateia e ganhou a primeira página do jornal USA Today. Por isso ele alerta: “É preciso cuidar das ideias e principalmente publicar em inglês”. E brinca: “Sugeriram até que eu colocasse no meu nome a palavra switch”. Jatene explica: “Em 1973 um trabalho do Dr. McGoon sobre cardiopatias congênitas mostrava o conceito de transposição das grandes artérias como interesse histórico porque isso jamais poderia ser feito. Mas com a experiência adquirida em cirurgias coronárias e estudando o coração de crianças, chegamos à anatomia factível, com a retirada isolada de cada artéria e a reimplantação. Até hoje, é a primeira escolha para recém-nascidos, com um a dois dias até dois meses”, explica o professor. A transposição das grandes artérias é a cardiopatia cianogênica mais frequente que se manifesta no período neonatal. Caracteriza-se pela discordância ventrículo-arterial, ou seja, o ventrículo direito tem conexão com a aorta e o ventrículo esquerdo com o tronco pulmonar. Geralmente, os recém-natos desenvolvem a cianose e/ou insuficiência cardíaca nas primeiras horas de vida, dependendo da presença ou não de defeitos cardíacos associados, necessitando de tratamento de urgência e específico, no intuito de melhorar as condições clínicas. Na transposição das grandes artérias, a circulação e em paralelo, isto e, o sangue insaturado chega às câmaras cardíacas direitas e dirige-se para aorta, com baixa saturação de oxigênio, já o sangue rico em oxigênio chega pelas veias pulmonares ao átrio esquerdo e saem do ventrículo esquerdo novamente, para os pulmões através do tronco pulmonar.

A presença de comunicação entre os sistemas pulmonar e sistêmico é fundamental para propiciar à mistura necessária a sobrevida. A condição mais encontrada e a presença da comunicação interatrial tipo forame oval, também se pode encontrar persistência do canal arterial, comunicação interventricular ou estenose pulmonar. Os principais sinais clínicos são a cianose universal, impulsões sistólicas na borda esternal esquerda e hiperfonese da segunda bulha em foco pulmonar. Sopros podem ou não estar presentes pela concomitância ou não de outros defeitos congênitos. O eletrocardiograma mostra sobrecarga ventricular direita e a radiografia de tórax silhueta cardíaca ovoide e trama vascular pulmonar aumentada. O diagnóstico definitivo e feito pela ecodoppler-cardiografia.

Uma vez estabelecido o diagnóstico, o tratamento de emergência consiste em estabelecer uma mistura adequada, que e obtida através da átriosseptostomia por cateter-balão (Técnica de Rashkind). O recém-nato em boas condições clínicas, isto e, compensado da cianose metabólica e hipóxia, devera ser submetido à cirurgia de Jatene, isto e, correção anatômica a nível arterial. Outras técnicas de correção podem ser realizadas a nível atrial, desde que as condições anatômicas não permitam a correção a nível arterial.

A transposição das grandes artérias (TGA) correspondente a aproximadamente 8% de todas as cardiopatias congênitas, ocorrendo com uma frequência de 1 em 3000 nascimentos. A correção da TGA pela técnica proposta por JATENE et al. (1) representou uma dramática mudança no tratamento destas crianças, já que as técnicas de correção atrial, apesar de excelentes resultados imediatos, apresentam importantes complicações na sua evolução tardia (2). Por ser um procedimento cirúrgico mais complexo do que as correções atriais e, também, pela necessidade de intervenção no período neonatal, a mortalidade hospitalar com a técnica de Jatene foi relativamente alta no início da experiência (1,3). Esta mortalidade imediata foi progressivamente diminuindo, podendo hoje ser comparada à observada nas correções atriais. Apesar da grande maioria das crianças submetidas à operação de Jatene apresentarem desenvolvimento físico, psicomotor e cardiovascular normais, alguns problemas podem ser encontrados na evolução tardia. Dentre estes, a estenose pulmonar ou de via da saída do ventrículo direito (VSVD) é o mais frequente e merece especial atenção do cirurgião pois sua incidência poderá estar diretamente relacionada à técnica cirúrgica empregada.

Fonte:

http://www.saudegeriatrica.com.br/cardio/transposicao.htm

http://www.scielo.br/scielo.php?Script=sci_arttext&pid=S0102-76382001000300008

http://www.brasilmedicina.com.br/interno/pgeditores_adib_t1s1.asp

Acesso em julho de 2005

Revista do Incor, dezembro 98/janeiro 99, pagina 14

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