No feriado de 21 de abril, dia de Tiradentes, não faltou assunto no almoço de família. Corria o ano de 1960 e, além da inauguração de Brasília, festejava-se o lançamento do JK, o mais moderno carro nacional da época.Era produzido pela FNM (dizia-se Fenemê, iniciais de Fábrica Nacional de Motores), uma estatal que fabricava caminhões e que havia comprado o ferramental e a licença para produzir o Alfa Romeo 2000. Seu nome era uma homenagem ao presidente Juscelino Kubitscheck, o grande entusiasta da implantação da indústria automobilística brasileira.
A origem do nosso JK está no Alfa 1900, do início dos anos 50. Depois da Segunda Guerra, foi o primeiro projeto da fábrica italiana e vendeu muito. Pensando mais longe, especificamente no mercado americano, a Alfa apresentou em 1957 o modelo 2000, com frisos, detalhes cromados e até um discreto rabo-de-peixe. Deu tudo errado: para o povo que estava acostumado com carrões silenciosos e suspensão macia, ele era áspero e ficava devendo em conforto. Até em casa foi rejeitado. Os europeus o acharam muito enfeitado. Mas para nós, brasileiros, naqueles tempos, ele era bom demais. É certo que não custava nenhuma pechincha. Eram necessários mais de 150 salários mínimos da época para comprar um carro zerinho. Quase 51000 reais em valores de hoje.
Mesmo exibindo o enorme cuore sportivo (marca registrada dos Alfa Romeo), com um escudo adaptado da FNM na grade, não chegava a ter o desempenho de um autêntico esportivo. Mas a tecnologia sobrava: câmbio de cinco marchas (uma novidade até então – e durante um bom tempo – entre os nacionais), duplo comando de válvulas no cabeçote, bloco do motor de alumínio e pneus radiais. O painel encantava com seu velocímetro sem ponteiro: a velocidade era indicada por uma fita vermelha que corria pelo mostrador. Ah, e o banco dianteiro inteiriço? Reclinado, praticamente virava uma cama de casal. Bons tempos de namoro a bordo.
Nas pistas, o JK já chegou apavorando e venceu provas de longa duração como as 1000 Milhas e 24 Horas de Interlagos, nas mãos de Chico Landi, Christian Heinz, o Bino, e Piero Gancia.Foi assim até que houve o golpe militar em 1964. Como Juscelino e outros tantos que tiveram seus direitos políticos cassados, o JK também teve problemas. Precisou mudar de nome e passou a ser o FNM 2000. Uma versão mais potente, lançada no Salão do Automóvel de 1964, teve o nome “Jango”, em homenagem ao ex-presidente João Goulart, cogitado. Mas saiu como “TIMB”, abreviação de Turismo Internacional Modelo Brasileiro.
O JK é bastante estável. Mais do que pedem os 95 cavalos do motor. Afinal, ao tracionar os 1360 quilos do carro, não podem fazer milagre. A direção, mesmo sem assistência hidráulica, não é pesada. É precisa, sem folgas. A embreagem, hidráulica, é leve, e o câmbio tem acionamento na coluna. Os freios, porém, nunca foram o seu forte. Exigem decisão e vontade.
Sua tecnologia cobrava o preço do pioneirismo por aqui. O duplo comando de válvulas, por exemplo, era uma caixa-preta para a maioria dos mecânicos locais. E a parte elétrica tirava o sono de muitos proprietários. Reestilizado em 1969, seu motor passou a ter 2150 cilindradas. Foi produzido até 1973, quando a fábrica foi vendida para a Alfa Romeo. Fim de um ciclo, começo de um novo: começava a ser produzido aqui o Alfa 2300, com o mesmo espírito: ares esportivos, com luxo e conforto.
Fonte: http://quatrorodas.abril.com.br/classicos/grandesbrasileiros/0103fnm.shtml
acesso em novembro de 2005
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