Papel com Celulose de Eucalipto

Max Feffer, e seu pai Leon Feffer fazem parte da história da construção da indústria de celulose e papel no País, um setor cuja instalação foi iniciada há um século e teve como precursores imigrantes judeus e árabes. Sua empresa, com ajuda do químico Benjamin Solitrenick, que trabalhou com os Feffers entre 1955 e 1988 e com um grupo de cientistas, liderou a pesquisa de tecnologia que revolucionou a fabricação de papel no Brasil e no mundo.

No Brasil, o grande incentivador da cultura do eucalipto foi Navarro de Andrade, executor da política florestal da Companhia Paulista de Estrada de Ferro. Navarro trabalhou de 1903, quando organizou o Hôrto de Jundiaí, até 1941, tendo fundado ao todo 17 hortos para a Companhia Paulista de Estrada de Ferro. Estudou os eucaliptos sob vários aspectos e fez uma coleção de 150 espécies. Grandes áreas têm sido plantadas com florestas de eucalipto. São florestas de rendimento, geralmente de propriedade de particulares, e cuja exploração racional visa satisfazer à demanda de madeiras, cada vez mais difícil de atender, frente à destruição maciça das florestas nativas. Usinas siderúrgicas e indústrias de papel, entre outras, procuram garantir o suprimento adequado de matérias primas pela execução de grandes plantios cuja rotatividade do corte lhes assegure a perenidade dos empreendimentos. O reflorestamento com eucalipto tem se revelado promissor nos solos profundos, permeáveis e de limitada fertilidade. A partir do eucalipto, foi obtida a celulose de fibra curta, cujas exportações hoje estão direcionadas a todo mercado internacional para a produção de papel de imprimir e escrever. A celulose de eucalipto, uma árvore de crescimento rápido no Brasil, é alternativa para a celulose de fibra longa de pinus, árvore que na Europa só atinge o ponto de corte em 30 anos, período quatro vezes maior que o do eucalipto brasileiro.

 

Leon Feffer tinha 15 anos quando o pai, fugindo da guerra na Rússia, partiu para o Brasil, em 1910, e como legado deixou sob seus cuidados a mãe e os irmãos. Para dar de sustento à família, começou a vender nas ruas as velas e os cigarros que fabricava em casa. Nascido em Rovno, na Rússia, a 27 de novembro de 1902, aos 18 anos foi contratado pelo governo comunista para distribuir alimentos aos flagelados da guerra. A carta que apareceu debaixo da porta, certo dia, trouxe uma novidade: o pai havia remetido para a embaixada brasileira em Varsóvia as passagens e o dinheiro para que a família pudesse recomeçar a vida nos trópicos. Antes de enfrentar a viagem de 31 dias, ele sofreu com o anti semitismo. “Na noite em que fui a Varsóvia, alguns alemães fugiam da cidade. Como todo judeu, me levaram para ajudar a carregar armas nos vagões”, disse certa vez.

A liberdade que faltava na Rússia foi a principal motivação. Aqui, não teve dificuldades para aprender o português e soltar a boa lábia de comerciante. Em 1923, com um capital de 272 contos de réis, fundou a sua primeira empresa, a Leon Feffer, que comprava papel das grandes empresas para vender nas papelarias de São Paulo. Visitava os clientes de bonde e armazenava a mercadoria no porão da casa alugada em que morava com os pais. O cubículo ficou pequeno demais para uma empresa com sede de crescer, e Feffer preferiu alugar uma loja no Brás, bairro de São Paulo. Em 1930, ele resolveu construir um prédio para montar uma loja e uma tipografia, dando início à produção de papéis e envelopes.

A produção própria começou no final da década de 30, com a instalação da primeira máquina de papel no bairro do Ipiranga, na capital paulista. Sua tipografia não podia ir melhor, mas a possibilidade de faltar papel no mercado nacional deu um frio na barriga em Feffer. Em 1940, optou por construir uma fábrica do produto. Como não dispunha do capital necessário, vendeu a loja e a casa para conseguir dinheiro e construir um novo negócio, que ganhou o nome de Companhia Suzano de Papel e Celulose, por estar localizado em Suzano, na Grande São Paulo. Utilizava celulose importada, mas logo quis livrar-se dos fornecedores estrangeiros. Depois de pesquisar durante um ano qual matéria-prima daria um bom produto final, descobriu as vantagens da celulose de eucalipto.

Com seus esforços em pesquisa e desenvolvimento, a companhia definiu a especialidade da produção papeleira nacional, sustentada no cultivo do eucalipto. Existe uma celulose brasileira. É um produto típico, quase exclusivo, como pode ser o álcool combustível ou o carro pequeno com motor de baixa potência. É uma celulose única, padronizada, competitiva em custos e muito bem aceita internacionalmente por suas características de opacidade e firmeza. Sua matéria-prima é o eucalipto, árvore originária da Austrália. Seu destino prioritário é o papel branco para imprimir e escrever e os papéis sanitários. Com a celulose brasileira, se produz o melhor papel para impressão eletrônica oferecido no mercado. A história dessa celulose começa com a Companhia Suzano de Papel e Celulose, fundada por Leon Feffer em 1924. Foi a Suzano a empresa responsável pelo início da produção, no mundo, da celulose de eucalipto em larga escala. Isso aconteceu nos anos 50. Poderia ter sido só a solução para um problema imediato. Mas foi algo capaz de determinar a identidade da indústria papeleira nacional, responsável, atualmente, por metade da oferta global de celulose de fibra curta.

No final da década de 40,a capacidade de produção da empresa alcançava cerca de 55 toneladas por dia. Era pouco se comparada com as décadas seguintes; em 1974 uma única máquina batizada B-7 produzia 250 toneladas por dia de papel fino. mas já era o bastante para colocar o problema da matéria prima. papel se faz a partir da celulose, a celulose naquela época era produto importado e de disponibilidade incerta, como ficou demonstrado durante os anos de guerra. Foi nesse momento que Leon Feffer tomou a decisão que iria inscrever seu nome na lista dos grandes inovadores da indústria brasileira: investir em pesquisas sobre a produção de celulose a partir do eucalipto. Como costuma ocorrer nesses casos, seu mérito não estava tanto na ideia, que não era nova, quanto na disposição de fazer o necessário para colocar tal ideia em prática. Experiências anteriores mostravam resultados contraditórios. As primeiras tentativas realizadas na Austrália, de onde o eucalipto é originário, não deram o resultado esperado. Mais promissoras pareciam as experiências brasileiras efetuadas pelo engenheiro agrônomo brasileiro Navarro de Andrade, da Companhia Paulista de Estradas de Ferro.

Por volta de 1920, Navarro de Andrade fora encarregado de encontrar uma espécie florestal cuja madeira alimentasse as caldeiras das locomotivas, fornecendo, além disso, postes e dormentes. O eucalipto logo se revelou a melhor opção e passou a ser plantado em larga escala, adaptando-se admiravelmente em São Paulo. Navarro de Andrade estava convencido que a madeira também seria útil na produção de celulose. Em 1925 seguiu para Winconsin, nos Estados Unidos para onde enviara quatro toras de eucalipto de quinze anos de idade. Ia acompanhar pessoalmente testes de fabricação de celulose e papel. Deu certo. Como prova do bom resultado, Navarro trouxe de volta exemplares da edição de 30 de setembro de 1925 do Winsconsin State Journal, impressos em papel que resultara dos testes. Um desses exemplares está até hoje no Museu do Eucalipto de Rio Claro.

Caso a experiência pudesse ser confirmada em larga escala, o eucalipto seria promovido à matéria prima ideal, tais e tantas suas vantagens naturais. Em primeiro lugar o eucalipto prospera muito bem em climas quentes, ao contrário de seu principal concorrente o pinho, que só pode ser cultivado nos estados do Sul do Brasil, distante do centro consumidor paulista. Além disso o eucalipto cresce com velocidade muito maior, ficando pronto para o corte em oito ou nove anos, o que só ocorre aos 25 anos no caso do pinho. E mais: depois de cortado o eucalipto rebrota até três vezes, fenômeno que nunca ocorre com o pinho.

 

Leon Feffer reconhecia a importância da parte técnica, mas não se interessava por seus meandros, preferindo deixá-la a cargo de Gunnar Krogh, vendedor representante das máquinas Karlstad da Suécia, que acabara vindo trabalhar na sua empresa, e sobretudo, de seu próprio filho Max Feffer, cujo papel mostrou-se absolutamente crucial no caso das pesquisas com o eucalipto. Espírito inquieto e independente, Max interrompera os estudos de engenharia em São Paulo, seguindo para os Estados Unidos para estudar música. De volta ao Brasil, reuniu um grupo de pesquisadores, realizando experiências não apenas com o eucalipto como também com o bambu, bagaço de cana, algodão, agave e outras fibras. Concentraram-se logo nas vantagens do eucalipto e depois de seis anos os testes conclusivos foram realizados na Universidade da Flórida, em Gainsville, nos Estados Unidos.

A empresa, com ajuda do químico Benjamin Solitrenick, que trabalhou com os Feffers entre 1955 e 1988 e com um grupo de cientistas, liderou a pesquisa de tecnologia que revolucionou a fabricação de papel no Brasil e no mundo. Em 1954, iniciaram-se os estudos de pesquisa de desenvolvimento da fabricação de celulose de eucalipto no laboratório da Universidade da Flórida, em Gainsville (EUA). Uma equipe de técnicos da empresa realizou centenas de testes e ensaios de cozimento, lavagem e branqueamento que confirmaram plenamente os resultados obtidos nos laboratórios da Indústria de Papel Leon Feffer S.A. Dois anos depois, em 1956, foi adquirida uma empresa no município de Suzano, para instalação da fábrica de celulose de eucalipto. No ano seguinte, a empresa firmava seu pioneirismo na fabricação de 25 toneladas/dia de celulose de eucalipto e produção de papéis de imprimir e escrever com 100% desta fibra.

Ficou demonstrado que a longa controvérsia em torno da celulose de eucalipto poderia ser reduzida à adequação ao tipo de papel que se pretenda fabricar. O papel feito com celulose extraída de madeiras de fibra longa, como o pinho é efetivamente mais resistente, e por isso mesmo mais adequado para artefatos como sacos e sacolas de compras. Em compensação o papel fabricado a partir da celulose do eucalipto, de fibra curta, servia perfeitamente para quem desejasse imprimir ou escrever. As imagens ou letras não deixavam marcas visíveis no verso das páginas, permitindo o melhor aproveitamento de cada folha. Mas essa constatação só veio anos mais tarde, quando so resultados alcançados por Max Feffer venceram a resistência dos clientes, o que não foi tarefa fácil.

A produção teve início no primeiro semestre de 1956, quando Leon Feffer comprou a Indústria de Papel Euclides Damiani, em Suzano, a 50km da capital paulista. As instalações industriais modestas, cercadas por um enorme terreno, casavam-se perfeitamente com a estratégia traçada pelos novos donos: começar com prudência, mas preparando-se para ampliação. Rebatizada como Companhia Suzano de papel e Celulose, passou a abrigar uma planta piloto de celulose com a capacidade de trinta toneladas dia. Inicialmente o produto final incluía uma base de celulose importada, misturada com apenas 30% de celulose de eucalipto. Logo depois essa percentagem passou para 50% e continuou subindo. Diante dos bons resultados Gunnar Krogh seguiu para Suécia com a ordem de encomendar com a urgência possível o equipamento completo para a produção de celulose. No ano seguinte, ele já estava instalado em Suzano e produzindo 120 toneladas por dia. Resolvido o problema técnico surgiu um obstáculo no mercado. Os fabricantes brasileiros não se interessaram de imediato em experimentar o novo produto, que ameaçava abarrotar os depósitos.

A solução encontrada por Leon Feffer foi consumir ele mesmo a celulose de eucalipto, não apenas na sua fábrica do Ipiranga, como também na indústria de Papel Rio Verde, estabelecimento já existente, que ele adquiriu exatamente com esse objetivo. Inaugurava com essa manobra uma tendência de ampliar alternativamente suas instalações de papel e celulose, cada ampliação sendo consequência da anterior e se tornando causa da próxima. Algum tempo depois de comprar a fábrica Rio Verde para absorver o excesso da própria produção de celulose, os concorrentes constataram a boa qualidade do produto final e resolveram experimentar, o que levou a empresa em apenas um ano e meio em aumentar a produção para 300 toneladas/dia.

Já havia eucalipto disponível no País – a madeira era usada na produção de dormentes de linhas férreas e como lenha – e fazia muito sentido investir na substituição de importações. Leon Feffer – e, com total dedicação, seu filho Max – buscavam a sobrevivência e a prosperidade do negócio. A Suzano produzia papel a partir de aparas e de celulose de pinheiro importada. Mas o aproveitamento do eucalipto em larga escala, algo que parecia pouco sensato há 50 anos, garantiria à empresa a auto suficiência em sua principal matéria-prima. Mais do que isso: forneceria as bases para o desenvolvimento de um dos maiores grupos privados nacionais.

A experiência deu certo. Com suas operações de celulose e papel e no setor petroquímico, as empresas Suzano apresentam um faturamento superior a R$ 2 bilhões, lucros próximos de R$ 500 milhões (base 2001) e uma firme posição exportadora. Em 1995, a revista Forbes citou Leon Feffer como o quinto homem mais rico do planeta, com patrimônio de US$ 1,6 bilhão. Morreu a 7 de fevereiro de 1999, com 96 anos, deixando dois filhos e oito netos, e empresas que se estendem aos setores petroquímicos e de telecomunicações. Após quatro décadas ao lado do pai, Max Feffer, assumiu a administração da empresa, quando deu início a um processo de reestruturação da Suzano. Max Feffer na presidência da empresa desde 1999, faleceu em 2000 aos 74 anos.

 

Fonte:

http://www.oriente-se.com/empresas/suzano.html

http://www.estado.estadao.com.br/editorias/2001/04/03/eco217.html

http://www.anefac.com.br/revista/Edicao_78/revista78_suzano1.htm

http://www.terra.com.br/istoe/biblioteca/brasileiro/empreendedor/emp18.htm

acesso em março de 2002

http://www.professorberti.hpg.ig.com.br/plantasmedicinais/plantcdef.htm

http://digilander.libero.it/stilo2/SCHEDAell.htm

acesso em julho de 2002

http://www.finep.gov.br/bv/noticias/ainven.htm

http://www.terra.com.br/istoegente/88/tributo/

http://www.estado.estadao.com.br/editorias/2001/04/03/eco217.html

acesso em janeiro de 2003

Pioneiros e Empreendedores, Jacques Marcovitch, São Paulo, Edusp, 2003 pg 261-266

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