A Intermed, fundada em 1982, por Milton Rubens Salles, está entre as 5% das empresas brasileiras certificadas pela ISO 9001/ 2000, mérito conquistado no ano de 2001, o que exigiu um procedimento de reengenharia na empresa e treinamento dos funcionários, sob coordenação de uma consultoria externa, a ABS Quality Evaluations. Inicialmente a Intermed era importadora de equipamentos médico-hospitalares, entre os quais ventiladores pulmonares. O ventilador pulmonar é um equipamento usado nos casos de insuficiência respiratório, com a função de realizar o bombeamento de ar enriquecido com oxigênio para o interior dos pulmões, permitindo de forma cíclica, a lavagem do CO2 (ventilação pulmonar). A amizade com Mário Amato, empresário de prestígio, permitiu o contato com um fabricante nos Estados Unidos para importação dos componentes de ventilador já de segunda geração, fazendo sua montagem no Brasil. Vislumbrando um importante nicho de mercado, o gerente de vendas Milton Sales em 1985 entrou em contato com o engenheiro mecânico da Poli, Jorge Bonassa, então trabalhando na área de bioengenharia do Incor, para produção de um ventilador pulmonar. Bonassa havia ingressado no Incor já em seu segundo ano de curso na Poli, para trabalhar em bioengenharia.
Já na Intermed, Bonassa foi para a Califórnia, para aprender a montagem do produto, propondo a nacionalização do equipamento quando retornou ao Brasil. Em 1987 a Intermed lançou o primeiro ventilador pulmonar da empresa InterSet, um equipamento com um novo design frente ao equivalente importado. A experiência em bioengenharia no Incor, com interação de médicos e engenheiros permitiu a Bonassa preparar programas de treinamento didaticamente muito eficientes numa linguagem que levava a engenharia até a medicina, em cursos formalizados através de convênios com universidades, já tendo treinado mais de 3 mil profissionais em mais de 16 regiões do país. Em 1989 foi lançado o Inter 3, micro processado, para uso neonatal e pediátrico, um grande sucesso comercial da empresa, que em 1993 ganhou cores mais alegres tornando-se conhecido pelo nome carinhoso “xuxinha”. O equipamento conseguiu reduzir a quase zero o índice de óbitos em neonatos causados por barotrauma, provocado pelo uso de ventilador pulmonar. Em 1996 foi lançado o Inter 5, para uso adulto. O Inter 5 reúne em um único equipamento diversos recursos, como ventilação com pressão controlada, pressão suporte, BIPAP, nebulizador, insuflação de gás traqueal (TGI), pausa expiratória para monitorizarão do auto PEEP, ventilação de backup, bateria interna, entre outros. Para o Inter 5 a empresa valeu-se de incentivos fiscais da lei de informática, num projeto que envolveu um total de investimentos de cerca de 40 milhões de reais. Em 2002 a Intermed se engajou num projeto mais ousado, lançado na Hospitalar deste ano, o InterPlus VAPS/GMX que incorpora mudanças no design e pode ser utilizado em pacientes neonatais, pediátricos e adultos.
Jorge Bonassa iniciou sua vida na Intermed como um engenheiro contratado. Reconhecida sua competência, os sócios preocuparam-se em criar um novo relacionamento entre ele e a empresa e lhe ofereceram uma participação de 10% na sociedade, um porcentual que foi crescendo com o passar do tempo até que chegou o momento em que Mário Amato entendeu que sua presença era simbólica e portanto desnecessária, sendo mais razoável que cedesse o seu lugar para Bonassa. A partir de então a empresa passou a ter dois sócios, Milton Rubens Sales e Jorge Bonassa com participação igual, o que comprova que Milton não tinha uma mentalidade patrimonialista, mas visava o sucesso do empreendimento. Bonassa resolveu em 1996 se especializar em pneumologia, obtendo no ano seguinte doutorado na Escola Paulista de Medicina na Unifesp ao dissertar sobre a técnica VAPS (volume assisted pressure support – ventilação volumétrica assistida com pressão suporte) por ele previamente desenvolvida e patenteada no Brasil e Estados Unidos (PI8805694) e lançada comercialmente em 1990. A tese “Trabalho respiratório durante a ventilação volumétrica assistida com pressão suporte VAPS” que teve orientação de Oswaldo Shigueomi Beppu analisou a ventilação assistida convencional, na qual o paciente pode estar realizando altos níveis de trabalho respiratório (WOB) como resultado do padrão fixo da onda fluxo respiratório característico desta modalidade. Para reduzir essa parcela oculta de WOB Bonassa propôs um novo modo de ventilação denominado Ventilação Assistida com Pressão Suporte (VAPS), onde ocorre o controle simultâneo do fluxo inspiratório e da pressão da via aérea. A técnica de utilização da pressão suporte associada ao fluxo controlado permite a redução do trabalho respiratório do paciente para diversas condições de resistência e complacência do paciente. Finalmente foi proposta uma nova modalidade de ventilação volumétrica assistida com pressão controlada (VAPC) onde o tempo inspiratório é o controle primário. A tecnologia VAPS após apresentada na feira de Dusseldorf passou a ser licenciada a várias empresas europeias. A Intermed teve duas patentes concedidas nos Estados Unidos uma referente a uma dupla válvula de exalação que elimina riscos de acidentes fatais (PI9001602 e US5303699 depositada em 1991) e outra referente ao modo de ventilação VAPS (PI9304638 e US5582163 depositada em 1993), bem como outras patentes depositadas no Brasil.
Segundo Jorge Bonassa: “A modalidade VAPS surgiu da observação de uma ocorrência comum em ventilação, quando o paciente inicia os esforços espontâneos: o acionamento do alarme de mínima pressão inspiratória. Essa ocorrência (indesejada principalmente nos plantões noturnos), devido ao ajuste inadequado entre a oferta de fluxo do ventilador e a demanda do paciente, frequentemente era atribuída pelos profissionais responsáveis pela assistência do paciente a um defeito do ventilador. Como o esforço do paciente entubado geralmente não é constante, o acionamento do alarme se dava de forma esporádica, dificultando a análise e ação corretiva por parte do operador. Na época os estudos clínicos estavam focados na redução do trabalho respiratório, pelo uso da Pressão Suporte, durante os ciclos espontâneos. A ideia de se associar a Pressão Suporte aos ciclos assistidos foi natural ao se reconhecer nos ciclos assistidos a superposição da respiração espontânea. Esse modo foi implementado inicialmente em um ventilador Inter 7 e sua eficácia comprovada clinicamente em um trabalho publicado internacionalmente, pelo grupo de pesquisadores da Divisão de Pneumologia do Hospital das Clínicas da USP”
Ainda no depoimento de Jorge Bonassa: “A dupla válvula de exalação foi desenvolvida para resolver um problema encontrado principalmente neonatologia. Os ventiladores neonatais de fluxo contínuo limitam a pressão na extremidade do ramo expiratório do circuito do paciente através de uma válvula de exalação. Caso ocorra uma obstrução no ramo expiratório, por exemplo, por acúmulo de água condensada no umidificador, a pressão do paciente se eleva além da ajustada, podendo causar barotrauma. Uma solução disponível na época era uma válvula de alívio atuada por mola, localizada no ramo inspiratório do circuito. Essa válvula deveria se ajustada previamente à colocação no ventilador no paciente e em um valor fixo. A maior parte dos hospitais simplesmente mantinha a válvula fechada, para evitar o limite inadvertido quando se desejasse elevar a pressão de trabalho no ventilador. A consequência, é que a falta de um limite de segurança conduz invariavelmente ao barotrauma quando qualquer secreção ou água aumenta a resistência do ramo expiratório. A ideia patenteada foi à colocação de uma válvula similar à expiratória no ramo inspiratório, porém devido a uma diferença no bocal da válvula, com uma pressão de acionamento ligeiramente superior à da válvula expiratória. Dessa forma, o operador ao ajustar a pressão de trabalho no ventilador, automaticamente estava ajustando a válvula de segurança, dispensando outros ajustes. O uso dessa tecnologia resultou em uma diminuição significativa da ocorrência de barotrauma, conforme registros de diversos Hospitais, os quais infelizmente não foram publicados. Essa linha é utilizada em toda a linha de ventiladores Intermed”
O projeto de organização da empresa foi orientado por assessoria da Faculdade de Economia e Administração FEA da USP, levando a uma departamentalização por processos, desta forma a empresa se capacitou para participar do primeiro grupo de certificação de empresas, no Sebrae-SP, ficando entre as poucas que obtiveram êxito naquele momento. O sistema EIS (Executive Information System) foi adotado e instalado em 1994 integrando todos os departamentos. Os projetos são gerenciados com o uso da ferramenta Advanced Product Quality Planning, APQP da QS9000. Em 1996, obteve a certificação ISO-9002. A Intermed possui 20 anos de experiência, líder no mercado brasileiro com 65% de participação nas vendas de ventiladores em 2001, do total de licitações do governo brasileiro, principal cliente no setor de equipamentos eletro médico. [Tradicionalmente o Estado tem dificuldade para comprar de maneira eficiente, o que se reflete nas dificuldades da implantação da engenharia clínica no país. Ademais, o critério de menor preço implica muitas vezes na quase de produtos de qualidade e durabilidade inferiores. Em razão destas dificuldades, algumas empresas de engenharia biomédica tem se voltado para a demanda do setor privado, onde o fortalecimento das empresas de planos de saúde representou também um crescimento da procura de equipamentos em geral]
Hoje no Brasil são cerca de 7000 equipamentos Intermed instalados. Segundo Gustavo Luís Vieira de Lima, diretor de marketing da empresa, a participação das exportações iniciou com exportações para Argentina, Bolívia e Peru em 1993 e atualmente atinge a Europa, Mercosul, no Japão, Turquia, Rússia, Índia, Paquistão e México, representando em 2002 cerca de 10% do total do faturamento da Intermed, deverá alcançar 20% em 2003 e atingir a meta de 50% em 2006. Em 2002 as exportações foram cinco vezes maiores do que ano anterior. Em abril de 2003 a nova linha Plus de ventiladores pulmonares foi certificada com a marca CE (Conformité Européene) em conformidade com os requisitos da Diretiva MDD 93/42-CEE abrindo as oportunidades de exportação para o mercado mundial: “Para se ter uma ideia, num ventilador existem aproximadamente 520 normas internacionais a serem seguidas”. Além disso componentes de equipamentos, desenvolvidos pela empresa, também são utilizados em conjuntos montados e vendidos por fabricantes da Bélgica. Para a Intermed a discriminação contra um produto desaparece necessariamente com a certificação do produto.
A determinação da portaria 444 do Ministério da Saúde, por meio da ANVISA – Agência da Vigilância Sanitária motivou a empresa a iniciar o desenvolvimento de um processo de qualificação. Ela regulamentou várias diretrizes, que obrigaram as empresas da área de equipamentos eletro médicos a se adequarem as várias exigência normativas, entre as quais às normas IEC, que contemplam os requisitos segurança e funcionamento do produto. Por outro lado tomou a decisão de migrar da ISO-9002 para a ISO-9001 que certifica qualidade de gestão administrativa e de processos e projetos, como condição para adquirir a marca CE para os seus produtos. Para tanto, a Intermed procurou o IPT, cujos laboratórios eram indicados pelo organismo certificador e o INPE para testes de compatibilidade eletromagnética e emissão radioativa. A DNV, organismo certificador da Noruega, foi escolhida para a adequação à marca CE, conseguida em 2001 para o monitor gráfico, o umidificador e o compressor a ar, para o que foi importante a contribuição do PROGEX. A certificação foi entendida como necessária não apenas para viabilizar um programa de exportações mas também para assegurar a competitividade no mercado interno, que desde 1990 havia sido aberto à concorrência internacional.
Para desenvolvimento de tecnologia, a Intermed conta no seu departamento de Projeto e Desenvolvimento com cerca de 35 técnicos e engenheiros das áreas de mecânica, eletrônica e mecatrônica, contando também com a colaboração de médicos. A equipe de P&D participa regularmente do Congresso Bienal da AARC (American Air Respiratory Care) e de uma das maiores feiras internacionais da área médica – a MEDICA, em Dusseldorf, na Alemanha, o que permite aferir a receptividade dos produtos Intermed no exterior. A participação nos congressos de anestesiologia deu origem em 1998 a um novo foco da empresa: a Línea A, a primeira máquina brasileira de anestesia em baixo fluxo, com vaporizadores calibrados, adequados ao IEC e em processo de certificação CE. Um programa de estágio avançado mantido com a Poli/USP traz alunos do quinto ano com interesse em equipamentos eletrônicos para atuarem como trainees e com possibilidades de contratação. A empresa mantém canais de comunicação com a Faculdade de Medicina da USP (onde está um dos grupos de pneumologistas mais respeitados mundialmente), Escola Politécnica, ITA e IPT.
O convênio com o IPT inclui ensaios de tecnologia e participação no PROGEX, projeto de apoio às exportações do governo Federal através da APEX, utilizando-se de incentivos fiscais da lei de Informática, que prevê a utilização de parte do que seria pago como IPI, para o emprego em pesquisa. Quando tomou conhecimento do PROGEX, a Intermed já mantinha um relacionamento intenso com o IPT, o que facilitou a inserção no programa. A Lei de Informática, originalmente a 8.248/91, já previa isenção de IPI para as empresas. Mas sua alteração, que resultou na Lei 10176/01, aprimorou o foco para investimentos de pesquisa e desenvolvimento em tecnologia da informação. Por este dispositivo aprovado em janeiro de 2002 as empresas selecionadas terão descontos de 93% a 97% na alíquota do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), mediante o investimento de 5% do seu faturamento em pesquisa e desenvolvimento tecnológico4. Através destes incentivos a empresa está investindo para aprimorar seus equipamentos conjuntamente com seis centros de pesquisa e universidades federais e estaduais de São Paulo, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Ceará, Pernambuco e Distrito Federal. A coordenação está sendo realizada pela UTI do Departamento de pneumologia da Faculdade de Medicina da USP. Segundo Gustavo Luís Vieira de Lima os principais entraves para um maior relacionamento com as universidades é o fato de possuírem uma estrutura muito piramidal, hierárquica, e pouco flexível às decisões, que demandam tempo para aprovação dos projetos.
Fonte: http://www.intermedbr.com.br/
http://www.intermedbr.com.br/asp/fullNews.asp?Cod=16
Acesso em abril de 2003
http://ce.mdic.gov.br/pd/default.asp
Acesso em abril de 2005
Gestão do Conhecimento de Pequenas e Médias Empresas, Isak Kruglianskas, José Cláudio Cyrineu Terra, 2003, Ed. Negócio, pág. 227-240.
Exemplos de competência, Histórias de pequenas empresas que sabem exportar, Setor Equipamentos Médico hospitalares e odontológicos, Progex/IPT, São Paulo, 2003, pág. 40-58.
Entrevista concedida em junho de 2003 durante a Hospitalar 2003 em São Paulo