Uso do Carbopol para Modelagem Cardíaca

O engenheiro Paulo Mendes em sua tese de mestrado testou 20 soluções aquosas com componentes diferentes em busca de um líquido que apresentasse comportamento semelhante ao sangue. Desta forma poderiam reproduzir em laboratório as condições da estenose (estreitamento dos vasos) e determinar o grau de obstrução das artérias que favorece a formação de coágulos. Uma vez formado, o trombo pode entupir o vaso e levar ao infarto, primeira causa de morte no Brasil. Com base nestas simulações podem-se estabelecer novos parâmetros em que se baseiam os médicos para fazer angioplastia ou ponte de safena em artérias obstruídas. Com isso pretendem evitar cirurgias desnecessárias ou apressá-las.

 

A estenose é causada pelo depósito de placas de gordura nas artérias. Com o espaço por onde circula reduzido, o sangue tende a acelerar na região antes do entupimento e , ao ultrapassá-lo, perde viscosidade. “Ele cria uma espécie de redemoinho, pois fica recirculando na área que se segue à obstrução”, explica o cardiologista Evandro Mesquita do Pró-Cardíaco, no Rio de Janeiro. “Isso propicia o acúmulo de plaquetas, as partículas do sangue responsáveis pela coagulação”, completa Mesquita. “Esse quadro é observado porque a viscosidade do sangue varia de acordo com sua velocidade. Quanto mais lento, mais viscoso e maior a possibilidade de formação de trombos”, diz Mendes.

Antes que isso aconteça só restam aos médicos duas opções: a angioplastia (uso de prótese para dilatar a artéria) ou a ponte de safena (uso de veias da perna como ponte para passagem de sangue). “As duas são recomendadas          quando o acúmulo de gordura obstrui 70% do vaso sanguíneo”, diz o cardiologista Eulógio Martinez, do Incor, em São Paulo. Segundo ele, no caso da artéria coronária, por exemplo, a medição pode ser feita por raios X, ultrassom ou contraste. O problema é que o parâmetro de 70% de obstrução foi determinado por experimentos com água. “A água diferentemente do sangue, tem viscosidade constante. Não importa se ela corre devagar ou se anda rápido. Por isso, o grau de obstrução que os médicos usam para realizar uma intervenção cirúrgica pode não ser o mais adequado”, ressalta o engenheiro.

Depois de tantos testes, os pesquisadores da PUC concluíram que o carbopol, produto usado na indústria alimentícia para engrossar misturas, era o ideal “Ele deixa o líquido mais viscoso, como o sangue”, diz Mendes, que há três anos se dedica ao estudo. Além da densidade o líquido escolhido tinha que atender a outro quesito: a transparência. “Tínhamos que ter um fluido transparente para que pudéssemos acompanhar a recirculação, pois só podemos estabelecer o grau de obstrução danoso ao organismo se soubermos a intensidade e a extensão do vórtice (os redemoinhos que se formam após o depósito das placas de gordura)”, completa o pesquisador. Mendes simulou situações em conco tipos de artérias: aorta (a maior), coronária (coração), femoral (coxa), carótida (pescoço) e arteríola (vaso menor). O engenheiro ainda não conseguiu estabelecer os novos parâmetros, que será o próximo passo. Por isso os pesquisadores estão fechando um acordo com o Incor para que cardiologistas passem a integrar a equipe e auxiliem nessa nova etapa. Desta forma, Mendes espera contribuir para prevenir os 500 mil casos de infarto registrados no Brasil todos os anos.

 

Fonte: Jornal do Brasil de 30.04.2001

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