Uma proteína descoberta na Universidade de Brasília e que poderá ser aplicada, no futuro, na destruição de células de câncer e de microorganismos, na purificação rápida das células de defesa do organismo humano e no combate a pragas da lavoura. A proteína foi escolhida em 1º lugar para ser lançada no espaço, em outubro de 1998, numa viagem do ônibus espacial da Nasa, agência espacial norte-americana. A proteína chama-se enterolobina e foi descoberta e purificada pelos professores Marcelo Valle de Souza e Lauro Morhy, em 1985. É proveniente de semente da árvore conhecida como tamboril ou orelha de macaco, encontrada no cerrado e na região amazônica. A enterolobina tem o poder de quebrar células de câncer e de purificar linfócitos (parte integrante do sangue humano ligada ao sistema imunológico). Há 13 anos, a proteína é estudada pelo Prof. Marcelo Valle de Sousa, Prof. Wagner Fontes, Prof. Carlos André Ornelas Ricart e Profª. Consuelo Medeiros Rodrigues de Lima, do Centro Brasileiro de Serviços e Pesquisas em Proteínas (CBSP) e, ao voltar do espaço em forma de cristal, obtida em ambiente de gravidade zero, pode ter suas propriedades melhor conhecidas.
Várias pesquisas na área biomédica têm sido levadas ao espaço para obtenção de resultados fidedignos devido à ausência de gravidade. Sabe-se que a enterolobina tem o poder de quebrar células de câncer e também de purificar linfócitos (células de defesa que integram o sangue humano). A proteína é obtida de sementes de Enterolobium contortisiliquumm, árvore encontrada no Cerrado e na Região Amazônica, conhecida como tamboril ou orelha-de-macaco. Os pesquisadores Marcelo Valle de Sousa e Lauro Mohry, do Laboratório de Bioquímica e Química de Proteínas da Universidade de Brasília (UnB), estudam a enterolobina desde 1985. “Centramos na área da pesquisa básica, não sabemos nada sobre as propriedades médicas da enterolobina”, alerta Marcelo Valle. O estudo para avaliação da potencialidade da proteína em matar células cancerígenas não foi aprofundado. Eles apenas colocaram as células em contato com a enterolobina e esperaram pelo resultado. “Foi um sucesso, acontece que, da mesma forma que ela quebra as células de câncer, mata também as células sadias”, afirma o pesquisador.
Segundo ele, seria necessário realizar uma investigação médica de como neutralizar o efeito da enterolobina na célula sadia para matar especificamente as cancerígenas. A possibilidade seria colocá-la no anticorpo e direcioná-la ao alvo. A primeira descoberta sobre a enterolobina, no entanto, foi a de que ela tem a capacidade de quebrar todas as células do sangue, menos os linfócitos, que são ligados ao sistema imunológico. A partir daí, os pesquisadores passaram a trabalhar numa fórmula cada vez mais eficiente de purificação de linfócitos. “De 96 até hoje, otimizamos o método de separação. Nesse período, providenciamos ainda o patenteamento do processo”, conta Valle. Os laboratórios de análises clínicas são os que mais vão se beneficiar desse método. A contagem de linfócitos é necessária nas análises que precisam avaliar a invasão de doenças, em função do número das células do sistema imunológico. É o caso dos testes de AIDS. Pelo sistema tradicional, a purificação de linfócitos pode durar até uma semana. No sistema desenvolvido pelos pesquisadores do CBSP, basta meia hora.
A enterolobina tem outras propriedades que justificam estudos mais aprofundados, como por exemplo, a capacidade de matar larvas de certos insetos nocivos à lavoura. Estudos feitos em parceria com pesquisadores ingleses demonstraram que a proteína matou o caruncho do feijão em sementes artificiais. Os cientistas sabem também que a enterolobina tem alta atividade inflamatória. Se for colocada diretamente na corrente sangüínea pode causar inflamações graves. “Isso pode dar um modelo de estudo para produzir uma droga antiinflamatória”, explica Valle. Depois que chegar do espaço, o estudo com a enterolobina vai continuar. Na forma cristalizada, a proteína será melhor analisada. Ela irá então para o Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS), em Campinas, onde será submetida a feixes dessa luz de altíssima intensidade que abrange o infravermelho, o ultravioleta e os raios X, além da faixa da luz visível. “Quando analisamos aqui no espectrômetro, apenas com raios X, o resultado não é muito eficiente”, conta Wagner Fontes, outro pesquisador envolvido no projeto. Fontes explica que a avaliação com a luz síncrotron será, certamente, mais acurada, porque o feixe de laser é mais fino, enquanto o raio X é largo. Além disso, a forma da enterolobina cristalizada no espaço, sem gravidade também permite uma análise melhor. Com ausência de gravidade, as proteínas se cristalizam de forma mais homogênea e mais rapidamente. Esse processo chama-se cristalografia.
Fonte:
http://www.unifesp.br/comunicacao/jpta/ed120/painel1.htm
http://www.radiobras.gov.br/abrn/c&t/1998/materia_311298.htm
http://www2.uol.com.br/JC/_1998/1006/cm1006a.htm
acesso em abril de 2002
Cronologia do Desenvolvimento Científico e Tecnológico Brasileiro, 1950-2000, MDIC, Brasília, 2002, páginas 314